Anjo barroco
Anjo barroco
E onde guardar esta coragem incansável
que raspa repetidamente a pele dos internos veios
como escultor meticuloso, em busca doutro tom
quiçá mais claro, ou mais negro
na madeira lisa, que escorre grumos
ao cair em círculos...
pelo chão.
E onde guardar tamanha coragem
ao ver-se ser noutra imagem que não a sua
embora toda esta clareza já nua,
da mão do artista brota
em cachoeira voraz
pelos vãos!
E como amadurecer a coragem
que por tantos veios já se fez passagem
levando todo o tronco duma árvore
redesenhando anjos que nem vi...
pelos dias.
E agora que sou eu, tão sacro e santo
pendurado num altar, com cara de manso
fico a lembrar das chuvas e dos negros pássaros
que por todas as florestas me fizeram afagos
e dos ninhos que com galhos protegi...
por ai...
Hoje nu em pelo, sou só anjo
estátua de uma beleza em prantos
a mercê de roubos, loucos ou cupins insanos
e é já sem coragem que me rezam...
e me pedem bençãos
que nem dei a mim.
Márcia Poesia de Sá.