MORTALHA
Um sábio falou em tempos de antanho:
“Para ser feliz precisa se ter o que AMAR, o que FAZER e o que ESPERAR”.
Inevitavelmente isto se mostrou uma verdade em nossa geração.
As centenas de best-sellers de autoajuda indicam que algo se perdeu pelo caminho.
Do AMAR sobrou o hermético egocentrismo,
Pleonasticamente contemplamo-nos a nós ante a vida,
Indivisíveis indivíduos que somos em monólogos eumistas;
Deuses de crenças monoteístas;
Narcisos autocráticos, monarcas absolutistas;
Não sabemos mais o outro
Ensimesmados em nossas conchas virtuais de impulsos ópticos e códigos binários,
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Do FAZER ficou-nos um eterno reconstituir do que já fora,
A latumiação infindável de palavras já ditas,
Playbackiamos o vivido numa ilusão de progresso,
Um neogandhi, um neohitler, a cada tempo ressuscitados,
Coma a água de um rio que tornará a ele num ciclo inter-minável,
A vida, montanha-russa com o mesmo ponto de saída e de chegada, revela-se.
Do ESPERAR nada sobrara,
Senão as duas mãos que cobrem a chama da vela em meio à tempestade,
O futuro é-nos dragão que ameaça o conforto de nossas misérias.
Sofremos diariamente uma terrível weltanschauung.
De guerras, escândalos e traições que indubitavelmente virão;
De sonhos de amor e de glória que sonhos continuarão;
A vida é queda e interrupção de queda que certamente virá.
É esta a única coisa que seguramente se espera
Deste pequeno intervalo que nos cabe,
Que resta-nos, então, senão tecer,
Penélopes, em presença dos inimigos,
A um Ulisses morto em costa estranha.