Poema de Trás-Os-Véus
Nota: Poema-Reminiscência. Leia-se à lusitana.
Minho e Douro, Trás-os-Montes
U'a cabana, que pobre entre pedras,
Mirava os campos e resistia ao tempo...
E u’a anciã, que pobre em seus trapos,
Mirava os campos... e resistia ao tempo...
Tempos idos e perdidos n’horizonte ao longe
Foi brisa forte de hoje à tarde, a passar-se e balançar-me os véus d’alma
Foi violino a sussurrar-me coisas d’aqueles tempos d’além-mar
E no sussurro-violino, lágrima vertia e brincava de rolar
Chorava eu, chorava violino, chorava saudade n’alma-menino
Saudades de hoje, saudades de então, as duas pois de mesmo perfume
Como o de anjos nos céus a perder-se em prantos e queixumes
Saudade exala-se de tempos-véus, esvoaçantes e sem lume
O poeta amado, não-poeta-ainda,
Pois que então a lavrar na vinha, na lida d’outra vida
Foi-se em promessas, e dos campos não voltou...
E na dor anciã que ali ficou, verteu o último fado, e expirou
Foi-se anciã, como brisa pr’os campos,
A varrer Trás-os-Montes com dor de amor
Foi-se ligeira a bater-se em pedras e rochedos, foi-se sem medos
Deixou-se soprar, pr’estas terras d’ultramar, ai marítimo corredor!
Veio a bailar-se em brisa ao som de choroso violino
Dest’alma de trás-os-véus, veio pr'estes céus
Ai, veio em sal molhado a rolar-se por esse rosto hoje menino
Escreve anciã, chora letras, embriagadas de vinho d’outrora
Aí dentro de mim, fermentes em vinho de mil poesias de agora...
Escreve anciã de trás-os-véus, escreve e chora
De Trás-Os-Montes, trás os fados pr’esta terra e cura a alma ferida
Trás os fados, mata o enfado, trás os fados pr’esta vida,
Enquanto eu-menino, ao choro de violino,
Enxugo o rosto molhado de poesia vertida
Escreve e chora, pois,
Escreves tu, choramos os dois...