Reflexões de um esqueleto

Neste vil mundo onde não sou ninguém

E tudo em mim é uma notícia antiga,

Que poema vagabundo abriga

Este desastre que vem do além?

Sigo entoando invisíveis cantos

Circunfluindo levas de fantasmas,

Todos reféns de seus ectoplasmas,

Meio demoníacos, meio santos.

E eu nesse bucólico recanto

Adjetivando inexistência,

Exercitando morta paciência,

Suportando o eterno, entretanto.

Aqui debaixo desta árvore torta

Proclamo a anti-desesperação

Que um esqueleto desmorona em vão

A natureza da pessoa morta.

Não estou morto nem estou vivendo,

Desonro a lógica e desarmo Deus,

Sou o flagelo de crentes e ateus,

A sua corrupção eu empreendo.

E eis-me aqui com o poder imenso

De nada ser e ser tão abissal,

Sem carne peçonhenta, sem o mal

De ter uma estrutura, um corpo denso.

Em decomposição, chego ao bom senso

De me reagrupar na natureza

Com a insubstancial leveza

E inteligência morta que condenso.

Se debaixo desta árvore penso,

Ziguezagueando em infinito sonho,

Porque resta em mim esse terror medonho

Da morte após a morte, que não venço.

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Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 12/07/2013
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