Metades

Metade de minha alma é lágrima.

Metade de minha alma é riso.

Metade de minha alma habita

Uma pequena parte do mundo.

Metade de minha alma rumina.

Uma monótona poesia.

Um cântico greco-romano

de guerra.

Essas metades vivem soltas, lépidas e

se reciclam.

Se diversificam.

E novas metades surgem

Do aleatório estado de coisas,

Da complexa simplicidade de tudo.

Ou em apenas parte:

em gotas, em orvalhos e

em lágrimas.

Mas a inteira e convexa essência

Conversa comigo ao cair da tarde.

Num diálogo intenso e sedutor.

Se desnudando sobre o véu rubro do

entardecer.

Diante dos tons e semitons

incandescentes.

Morri muitas vezes.

Tal como agora.

Inesperadamente.

Inexplicavelmente.

Era hora de morrer.

Deixar vestígios e palavras.

Deixar gestos e fonemas.

Deixar panos e doenças

empilhados num canto

da existência.

No rodapé do lirismo

o ponto e vírgula salvou-me da morte.

E, a vírgula da angústia do suicídio.

Do gáudio dos opressores.

Dos inimigos instantâneos e inexplicáveis.

Das sombras da noite que se fecha

Para nunca mais abrir.

Esse poema fala de metade de minha alma.

Da calma que não tive.

Dos medos que me carcomeram.

Das culpas que em latejavam

Como dores poentes.

Como sol nascente

rasgando o horizonte com

a ingenuidade das manhãs.

Metade de minha é quente.

E a outra metade experimenta o frio.

É o rigor cadavérico, é falta de sangue

É a mumificação provisória

daquilo que foi um dia.

Um corpo,

uma mulher,

um ser humano

que habitou silenciosamente

a outra metade da alma

que só encontrará quando finalmente

ultrapassar o último umbral.

Quando se exaurir o último momento.

Qual terá sido sua última palavra?

O meu último sentimento?

Ou lembrança.

Qual terá sido seu último desejo?

Qual terá sido a última impressão

desse mundo?

Imundo, insincero e cruel.

Diverso, imenso e afável.

Aberto e fechado.

Rindo e chorando.

Iluminado e em trevas.

Metade de tudo se exaure.

A outra se eterniza

Completando um ciclo.

Encerrando a estória.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 08/04/2013
Código do texto: T4230411
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