A sereia e o pianista
Aquele que foi visto dançando
Alegre a festejar
Aos olhos deles era insano
E foi atirado no mar
E o homem que tocava piano
Saiu correndo do bar
"Que ato mais desumano!"
pois-se o pianista a gritar
Mas era surdo o bando
Nunca poderiam escutar
A música do alto serrano
Que o jovem queria dançar.
Vingança de sua paixão
Por tamanha agressão
Os surdos de coração
Podem ouvir sua canção.
O pianista virou e viu
Uma jovem na beira do cais
De semblante belo e sutil
Com lágrimas nos olhos demais
Ela para o pianista olhou e sorriu
E o músico não esqueceria jamais
Que o traço antes gentil
Tomou aspectos mortais
E o grande mar se abriu
Com o poder de mil vendavais
A moça pulou e caiu
Sumindo em meio aos corais.
Escute com atenção
A música vinda do mar
Mas não siga a direção
ou pode se afogar.
Vez em quando, volta e meia
Aquele que desafia sua sorte
No mar baixo ou em maré cheia
Seja fraco ou seja forte
Mesmo aquele com coragem em sua veia
que tem o nado como esporte
Nunca mais pisa na areia
Vindo do sul ou vindo do norte
Se surpreende, cai na teia
escuta algo que lhe importe
ouve o canto da sereia
e descobre a própria morte.
As lágrimas de sua tristeza
Tocaram a água do mar colossal
Mudaram sua natureza
Ontem doce, hoje sal.
O bar não tem a mesma alegria
o pobre pianista
Nunca achou a melodia
Para o que nos olhos pois a vista
Por conta da covardia
Abandonou a carreira de artista
Vive longe do mar, numa abadia
O outrora musicista
hoje tem hidrofobia
e vai no psicologista
Dia após dia
Cada banho é uma conquista.