Um paladino da literatura
Tua paixão pelas letras é um perigo para a vida
quando é a ti que diz respeito.
Mas é a tua salvação quando se lança sobre ela.
Este paladino que se alberga em ti será
sempre perseguido pela peste emocional.
Descansa agora, goza os frutos do teu êxito
e do teu prestígio...
Em poucos anos serás esquecido
Recolha-te agora ao merecido repouso,
ao limbo, execrável, que te espera...
Cultiva, majestosamente, a grandeza
na tua profunda solidão espiritual
e cessará teu sofrimento milenar.
Almejas a glória?
Que abissal estupidez!
Permanecerás no lameiro.
Acharão mesquinhas tuas ideias e
teus supostos valores.
Não te iludas esperando que lhe rendam
a devida (e justa) homenagem.
És um gênio limitado.
Um Zé Ninguém. Mas não se subestime.
E não tomes isso como menosprezo.
Tens ciência de que a vida se esgotará
quando auscultar a voz que murmura no teu íntimo.
Quer seja glorificado como gênio,
ou encerrado numa instituição psiquiatra,
muitos hão de seguir as tuas pegadas.
Granjeará o séquito dos povos,
por tuas máximas e revelações.
Por suas paixões desnudadas em versos.
Eis a tua recompensa: sofrerás a sorte imposta
a outros teus da mesma estirpe.
E então, ao último suspiro profetizarás
com o orgulho de um velho sábio:
“Plantei a semente de palavras sagradas neste mundo,
que germinará mesmo em solo árido.
E quando muito depois de morta a palmeira abalar o rochedo,
E quando o esplendor de todos os reis não for mais que
podridão das folhas secas,
Através dos dilúvios mil arcas guardarão a minha palavra.
Ela prevalecerá.”