-nonsense poem about brazilian god-
parem com essa tagarelice a respeito de deus!
que ouse todo homem tentar descobrir, do sol
que o aquece, da água que toma, do chão que pisa, do pão
que come, a parte justa que lhe cabe, a face oculta de deus!
que todo homem tenha fé, mas uma fé toda sua,
só sua, que jamais se deixe enrubescer por nada que lhe
diga um estranho, que se guarde ele na presença do inimigo!
para que me querem desse jeito, daquele jeito, se não podem
viver suas vidas, se deixaram de acalentar um sonho,
qualquer que seja?
pois não há um isto preferível a nenhum aquilo, não na
essência ao menos.
os doze papéis manuscritos, em que se lia:
"... é como se num velho espelho emoldurado por madeira talhada
deixássemos de ver nossa imagem, vampiriazados pelo desejo que
arde doentiamente em nossa carne, pelo eterno sentimento da perda...
o novo empurra o velho, a vida pulsa, nós é que estacamos, tentando
estancar o sangue, nós é que criamos e catalogamos a palavra hipocrisia, afasia arraigada em nosso curto tempo, a palidez esquálida do cotidiano, andando pelas ruas de qualquer cidade eu não me sinto, melhor ou pior, a bem da verdade, mais do que um estrangeiro, um pária, um desterrado, enfim: é o mundo como tal que não me parece dizer respeito, suas lutas, externas e internas, e caminho com a perspectiva estonteante de matar-me..."
parem com essa tagarelice a respeito!
se este homem que lhes fala dará ou não cabo da vida
é um outro e megaloridículodramático capítulo da novela
e minhas pernas estão moles: terei perdido o tempo da cena?
o homem que se vê no espelho toma um susto! é cômico! aquelas
carnes grudadas no seu rosto, os olhos verdes-claros e esbugalhados,
a boca ressecada e partida, a barba por fazer, olheiras dando um leve
charme decadente, dândi empobrecido.
o homem que perdeu a identidade 23063321-3! Isto é fácil, o difícil é a
identidade metafísica... as pulgas atrás das orelhas da alma, os grilos cri cri cri... os pruridos e os queixumes do pensar, as sorrateiras delícias da dor!
- Puta sacanagem! hein velhinho?
tenho três boucas e um ouvido mouco... e me chamo nostalgia-de-lagarto!
vacilei, vacilei, vacilei... é quem que nunca vacilou? que atire o
primeiro dólar! que degole seu orgulho e deguste sua mágoa! que vá
a forra se for capaz!
Não se apavore! Não se apavore! em que beco ela se esconde,
a AMEAÇA REAL?
sou um náufrago brasileiro, e sexta-feira é uma bola de vôlei:
- Hortência, por favor, volte!