NEM TANTO CINZAS, NEM TANTO PÓ
Bem sei que é ali que escrevo,
No covil da víbora, meu diário.
Temores que nem minha alma confesso,
Mesmo que feche meus olhos sob o sudário.
Sinto-me tão desconfortável quanto
um anjo em uma camisa de força!
Tão cheio de adeus, tão cheio de espanto,
chegue perto de mim e ouça:
Já não bastar nascer de espinhoso ventre,
Ainda ter que me alimentar de tua lama
Um fim pra esse berço de dor presente
Qual ser a agonizante que não conclama?
Se cansei por esperar por bons dias
É porque enterrei a esperança bem longe.
Fiz de mim um mendigo das agonias
e no ceticismo, tenho a fé de um monge.
Nem tanto cinzas; Nem tanto pó.
De um querer a mim tão estranho
Vejo-me, na morte, andando só,
pois não sou cordeiro de rebanho.
Não sou cadáver que esperneia
A porta de tua funerária!
Mas sou um fantasma que vagueia
Em companhia da deusa mortuária.