DESVARIO**

Tenho uma ânsia forte a me roer por dentro,

um furacão querendo esvair-se em lava,

fogo e fumaça,

a cobrir a velha terra devastada e seus cacos,

derrotas, lutas inglórias,

ressacas e sonhos não realizados.

Queima-me a paixão pela arte

e como quem martela ferro em sua bigorna

eu choro em letras,

imagens e sentimentos que não se agüentam estanques.

Romper o dique que lave e leve a alma além,

numa revolução impossível, improvável,

sem sangue.

Mas toda renovação tem sangue e seiva derramados,

levando abaixo

floresta e jardins plantados,

ordens e castas estabelecidas,

curando e criando novas feridas.

Mas quero!

De dentro vem o grito,

um ímpeto de romper o muro que me barra,

de explodir em fogo e lava,

em corações despetalados,

em rosas deslumbrantes

brotado do solo seco da paixão perdida.

Há uma vontade de ver o céu se abrir

e se romper os sete selos prometidos pelo profeta.

Ver chegar a carruagem e despencar a fúria divina.

Há um lado que cala, compactua.

Outro que grita:

Merecemos a revolta e o revôo de Deus sobre nossas cabeças

cortando laços e desvarios.

Um basta, um juízo, um norte, um vento forte.

Tenho tudo isto assim

em redemoinho contínuo querendo sair furacão por ai

devastando telhados,

arrebentando fios e tensões.

Há um oceano de espera,

uma água cristalina aprisionada,

uma ânsia que me assalta e inquieta.

O que me resta?

Poeta.

Inundar a todos com estas imagens,

sons mudos e harmonias sem ritmos.

Com a música desconexa que a cidade inspira

e o silêncio distante.

De perto tudo é gênese e fim.

cp-araujo@uol.com.br