Meio Mau
Há dias em que sou o vinho deixado na taça,
aquele algo à mais capaz de exceder a dose,
o aroma inebriante de um alucinógeno invisível,
o coringa do baralho desfeito sobre a mesa,
o palhaço de riso caído pintado ao contrário,
sim, talvez eu nem seja louco, apenas não seja bom...
.
Andei gritando para as paredes esperando respostas ecoadas,
ouvindo o silêncio de minha alma translúcida sob as ondas...
.
Há dias em que sou o nanquim derramado sobre a tela branca,
borrando uma obra de arte ainda nem iniciada pelo pintor,
o tormento noturno de pesadelos de um passado-presente,
a indesejável recordação de sentimentos cortados em tiras,
o labirinto de espelhos do qual não se acha a saída,
sim, talvez eu nem seja mau, apenas não seja correto...
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Andei dando socos no ar esperando o nocaute de um tufão,
revolvendo a pá de cal sobre os escombros de meu sorriso perdido...
.
Há dias em que sou o barulho ensurdecedor de uma cidade de pedra,
corrompendo a paisagem do horizonte com minha indiferença ignóbil,
a revoada de gafanhotos em uma mente insana na madrugada,
o vinil tocando incessantemente na vitrola da lanchonete abandonada,
o assovio do vento em um dia cinza de frio e nevasca no pólo norte,
sim, talvez eu nem seja incorreto, apenas não seja o desejado...
.
Talvez eu só seja meio mau...