Chove

Chove, lentamente….,

Como um dedilhar de harpa fértil,

as gotas caídas do beiral

sucedem-se em cadenciada melodia,

Numa indulgente estival sinfonia.

Há quanto dias que o Sol,

Não sai do seu indolente repouso!

Vestiu-se o Céu de nuvens de cinza-prata.

Pela janela, embaciada de memórias passadas,

reconheço vultos indefinidos,

formas,

trilhos sem rosto!

Sei que há alguém, ali…

Para além da condensação teimosa,

Que me turva a visão...

Quem sois?? De onde vindes, oh gente sem rosto!!

Conheço-vos?? Conheceis-me?

A resposta tarda-se! A angústia aumenta…

O corpo treme, .... a respiração está suspensa!

Tu!! ???

Canalha!

Vil mostrengo!

Porque ainda atentas, a minha existência?

Porque me castras a alma?

Porque me roubaste o lirismo,

Que fertilmente, cultivei outrora??

Porque insistes em pairar como ave agoirenta,

Não há carniça para ti!!

Ainda não morri!

Maldito sejas!!

Não me aniquilarás!!

Se isso desejas!

Vou-me reerguer-me um dia,

quiçá amanhã??

Por ora, em convalescença, sigo,

Hei-de encontrar o meu caminho...

e o estreito fio do novelo, nesta enrodilhada vida ..

Onde me perdi!

Rute Gomes

2011