ARCO SEM ÍRIS

Com um viscoso ácido letárgico,

Desemperrei a trava do tempo

E folheei o livro do destino.

Desemboquei no apinhado purgatório,

Era o acerto de contas, o juízo final.

Vi, que o vazio que preenche a matéria

É a lacuna que fecha a debilidade.

Na dormência que camufla a dor,

O sonho da finitude da alma

Esculpe o esboço sinuoso

E fotografa a iminente desgraça.

O mundo em prece ao anjo negro

Para exumar a luz espiritual

E lavar-se na chuva que ferve

Sobre o iceberg da inerte mente.

Cacos de estrelas cadentes

Emolduram o espelho do fenecimento.

Neste covil de impurificados anjos,

Na penumbra xingada de alvorecer,

O horizonte é um arco sem íris,

E rabisca no desbotado céu,

O desejo de ceifar todos os espíritos.

Assisti a procissão dos desnutridos,

Lamentavam a incompletude do sonho.

Pessoas febris e mumificadas,

Lideradas por um convencido barbudo

Que ostentava a perda de um dedo.

Enquanto estava em homilia,

Ele prometia salário e bolsa família.

A pólvora da opressão multiplicou-se.

O inferno veio para o banquete.

No gatilho do apocalipse,

A última respiração e o tiro certeiro.

A escopeta atômica fora acionada,

Tingindo o mundo de vermelho.

Inexistia coesão no espaço vazio.

Planetas agonizavam em chamas,

Com seus átomos desintegrados.

Nada havia para ser lembrado,

Somente treva, sem o azul do céu