ENTENDA
Entenda você ó criatura de Deus,
Que o presente maior você já tem.
Ainda que habitá-lo nos dias teus,
Ao sair de ti, ficarias dele um refém...
Porque o velho ainda permanecerá novo,
Somente é, porque continua por ti usado;
Dentro de um mundo casulo, como o ovo,
Passado sem vida, vinga ao ser chocado.
O que te amedronta não são as maneiras deste adeus?
Pense na despedida como sendo um tesouro sem preço,
Pois se pobre ou rico, a vida, na morte vira um adereço,
Entenda que não existe diferença entre os fiéis e ateus...
És um sábio? Diga-me então, se aqui há limites entre céu e chão?
Eu respondo que não! Se assim fosse, nossos anjos não morreriam,
Nessas sementes que o ódio traga, e que aqui nunca mais vingarão.
Como num ressuscitado, a morte e o tempo sempre te desafiariam...
De ti o que tiraram, voltaria à tona em arte.
O que mais então tu pedes em recompensa?
O que me abate, é fio da faca que te corte!
E depois vem em mim com esta morte densa.
Morrer! É prazer da consciência, em alma lavada;
E quando não se é entendida, fica presa e sofrida.
Como num derrame acometido, permaneça calada,
Apenas olhe e angustie, querer nascer noutra vida.
Tão gélida, e mesmo sem chegar a nenhuma morada,
Sinta-se em casa por aquilo que existiu, e assim viu,
Deite-se olhando pro infinito nesta sua hora marcada,
Na passagem conformada do choro, quando já partiu...
Mergulhe profundamente, num lago frio, negro e borbulhante,
Afogue por um momento, esta grande fome de muitas nações,
Que pedem misericórdias em vida, deste mundo cruel, errante.
Depois me diga se em seu lamento, você morreu sem razões...
Numa gigante selva sem flores, sem pássaros e de nenhuma fonte,
Enterre agressões, e todas as pessoas assassinadas covardemente,
Que não puderam ser salvas, mesmo que a pedir socorro alucinante;
Depois me diga se em seu lamento, há um futuro neste horizonte...