ENCONTRO DE ESPELHOS

Ia e vinha como sempre
Quando te percebi diferente
Nunca havia parado para observar
De repente me peguei a te olhar

Já tinha visto sua moldura
E até reconhecia sua inevitável formosura
Você sempre teve arabescos medievais
Mas só agora percebi como brilham demais

Acho estranho este brilho excessivo
Nunca te senti tão expressivo
E na magia de uma superfície de cristal
Me conduzes a um mundo irreal

Estou há muito diante de ti
Será que alguém percebeu que enrubesci?
Olho para ti novamente
Com certeza você percebeu que estou diferente

Diferente também você está
Brilha tanto que consegue minha visão ofuscar
E neste imenso turbilhão de luz
A tua visão é tudo que me seduz

Dentro de você há um mundo incerto
E no centro de tudo um imenso deserto
Este vazio estranho me fascina
E logo percebo o que ele me ensina

Empalidece minha mente
O que quer me mostrar este demente?
Dou as costas e saio correndo
Ele já percebeu que estou sofrendo

Ai se eu pudesse cobrir você com um pano
Assim não veriam meu penoso dano
Que há muito busco sem encontrar
Um espelho que me faça finalmente brilhar

Volto a olhar-te novamente
Curiosa e ao mesmo tempo descrente
Preciso encarar esta enorme dor
Para que minha vida possa mudar de cor

De repente, não mais que distante
Vislumbro um vermelho errante
Qual não foi minha cálida emoção
Ao ver abandonado meu pobre coração

Como poderia ele ainda vermelho ser
Se amor há muito não merecia receber?
Peguei então meu coração e o acolhi com carinho
Certamente olhei no espelho para não mais deixa-lo sozinho

Retornei reluzente com o coração vibrante
Medo não mais sentia e a solidão ia distante
Queria agradecer o espelho por cessar meu pranto
Mas não encontrei a moldura para meu espanto

Não vejo mais os arabescos e o brilho do cristal
Em seu lugar, surgem dois olhos que me fitam sem igual
Logo então a conclusão mais óbvia me vêm
Meu lindo espelho se transformou também.