“O MITO DA SECA” [ManoelSerrão]

Na sesma o sol a pino estia, assola, recrudesce o árido,

Seca a lavra, a sebe, a parelha, o estipe, dissipa a mata.

Na sesma o sol lasca na pedra o esterco e da tapera resseca a palha.

Na sesma o sol é foice cega afiada que ceifa da relva a seiva.

Arranha a boca ferro, arrebenta a fome e ressaca a couraça.

Na sesma o sol varre do cacto a vida e na serra o poial quebra sem racha.

No latifúndio a chuva caída é encharco que semeia o pasto.

É rega d’água que dar engorda no curral ao rebanho castro.

No latifúndio a chuva corrida é seda, sal e repasto farto.

Na sesma o sol impõe a dor, desvanece e a honra "vaga".

Apea a laço o peão sem arção e ave sem canto faz piar sem grão.

Na sesma o sol faz do polirrizo da gleba porção rasa sem chão.

Na sesma o sol sem cirros plange e o homem para o êxodo parte.

Estival a soco e a golpe de língua a morte anuncia:

Na sesma o sol até que corpo e alma o juízo jazem na cova acaba.

No latifúndio o sol da sesma é a senha para o jugo do campo.

É barganha que desterra a séculos [en]terra e degrada.

No latifúndio o rico din. din. é rito desigual, dívida imoral sobre a mesa.

É arma que atira na grei da sesma e sobrevive do “mito da seca” sob a capa.

Entre pedras e rosas.

Destino e sorte.

Vida e paixão.

Na sesma o dote é a morte.

Imagem: Gravura do artista plástico Aldemir Martins.

serraomanoel
Enviado por serraomanoel em 17/07/2010
Reeditado em 17/07/2010
Código do texto: T2382574
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