Espelho de Narciso
Às vezes tento encontrar partes perdidas de mim mesmo numa longínqua estrela;
Já em outras, mergulho desenfreadamente em meu próprio oceano sem fundo, a prospectar respostas para velhas questões.
Não tenho exata noção dos perigos a que exponho o meu frágil Ser, nesse temerário mergulhar;
Porém continuo mergulhando, mesmo à custa das feridas que reabro nessas viagens abissais.
Este meu viajar sem rumo, prenhe de objetivos abstrusos, vem encontrar porto mais acolhedor
Quando a nau dos meus olhos ancora suavemente num doce rosto de mulher, refazendo a mítica união de seres que originalmente formaram um só.
Esse reencontrar-se, o descobrir-se no Outro, tem para mim, o gosto restaurador da água que mata a sede do viajante,
O deslumbramento do cego ao reabrir os olhos e ver as suas pupilas inundadas pela luz do sol, tal o encantamento de que me sinto tomado.
È nesse clima de reconhecimento, absurdo enamorar-se de mim mesmo refletido em ti, que sinto uma redoma protetora formar-se,
A reunificar nós dois, que desde épocas imemoriais fomos unos.
E, nessa mágica aura de mútuo enamoramento que formamos, vejo desenrolar, como num sonho, o encontro de Narciso com o Lago, tal o encantamento que envolve minha alma.
Alma gêmea é quando nos encantamos ao reencontrar a metade perdida de nós mesmos num outro corpo, refazendo uma Unidade que afasta de nós a sensação de inadequação, de orfandade.
Vale do Paraíba, noite da penúltima Sexta-Feira, Janeiro de 2009
João Bosco