PAPOULA
Na minha carne alaranjada se mexendo a ondular, fico a olhar os meus dedos um tanto transparentes pela claridade da lamparina, onde negras mariposas como uns querubins, descem e sapecam as delicadas asas, na luz de um olho só. Escamas crescem em minha pele onde escorrem suores azuis, parecendo veias finas..., enquanto os meus pêlos dos braços, como pequenas formigas, caminham-me... A minha cabeça com gosto de ferrugem, escorrega-se pela minha garganta adentro..., morre-se; depois é regurgitada com uma outra face em vida para a luz que me espera, em vermelhidão de minha calma. Os meus dentes enormes me avisam que não me conheço! Corpo longo, boca soltando sopros de fumaça... Eu estou enrodilhado em cima da mesa... Metade cobra, um pouco de metal, fico assim meio estátua...
Joinville, Janeiro de 1984.
Ps. Hipócrates foi um dos primeiros a descrever seus efeitos medicinais contra diversas enfermidades. Há quem defenda que mais tarde, um médico grego em Roma, padronizou a preparação do ópio com uma fórmula (o mitridato) e a receitava aos gladiadores. O uso do ópio difundiu-se pela Europa no início do século XVI, mas sofreu forte combate quando a Igreja Católica começou a controlar os remédios. Foi por essa época que Paracelso, o famoso médico e alquimista suíço, elaborou um concentrado de suco de papoula - o láudano, que teria o poder de curar muitas doenças e até de rejuvenescer. A disseminação desta crença levou à popularização do seu uso em todo o mundo ocidental. Com o tempo e com a expansão das rotas comerciais, o ópio acabou por se tornar uma droga universal.