Acidente de trânsito

Acidente de trânsito

Tal qual um caminhão desgovernado, descendo a ladeira,

Frases feitas, insípidas, colidem com ébrias expectativas.

Vítimas adolescentes, amores sem vida, são retiradas dos escombros.

Uma providencial chuva de verão apaga as marcas do ato:

Na manhã ensolarada, a dama de batom vermelho faz ressoar os seus passos ritmados,

Recados codificados, endereçados ao observador postado na janela.

Sonhos que se querem eternos, cadáveres enfileirados, na fria rigidez do asfalto.

A chaminé da fábrica entra em operação, o camelô, esfregando os olhos de sono,

Apregoa as suas quinquilharias. O cheiro de pão, vindo da padaria, impregna as narinas;

Na praça deserta, o pregador demente anuncia o fim do mundo aos gritos.

Atrás da árvore, um casal de namorados, alheio a tanto conflito, troca um beijo sem final.

A normalidade se instala, ocupa o lugar do abandono – o coro dos contentes ensaia prá mais um dia.

Quando eu era ainda uma criança, e me sentia muito triste, corria para a beira do rio Gongogi, aonde ficava olhando as águas plácidas por horas e horas. O canto da correnteza, logo acima, me trazia de volta a paz, da qual, por instantes, eu havia me divorciado.

Terras de São Paulo, manhã da primeira Sexta Feira de Fevereiro de 2010

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 05/02/2010
Reeditado em 05/02/2010
Código do texto: T2070505
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