DA JANELA DO HOTEL
Da janela do hotel
Vejo janelas opostas
De prédios eqüidistantes
E gentes pensativas
Amoldando os parapeitos.
Debruçam-se no espaço da vida
Entre os pensares que os prendem
Ao quarto desalinhado
E aos ares promissores do além-janela,
Para os quais essas gentes ainda não possuem asas.
Uma rolinha assustada voa próxima de mim.
Acompanho-a com os olhos
E meu corpo se comprime na parede,
Querendo ser Jesus, querendo algo mais.
Se o mundo é presídio,
Os espaços que o homem constrói
São solitárias malcheirosas e sufocantes de se viver.
Prefiro os espaços de Deus.
Onde há sempre sinuosos caminhos que se encontram,
Formas que se completam,
Montanhas que abraçam vales,
Planícies que abrigam campos,
Rios que percorrem distâncias e dão a volta ao mundo
Num tempo infinitamente menor que 80 dias.
Da janela do hotel não vejo tudo isso.
Nem sempre encontro o enquadramento perfeito
Para fugir das janelas opostas.
Mas este Ser que me domina
Faz abrir-se em mim uma janela
Por onde não passam apenas idéias:
Viajam sonhos, descortinam-se visões de coisas
Que nem sempre os olhos vêem da janela do hotel.