VIAGEM POR UM FLASH
Por um átimo eu saio:
Saio do templo de mim
Para degustar novas paisagens:
Paisagens que mostram
Naturezas mortas, vivas;
Egoístas, magnânimas, malévolas;
Ecletismos e aquarelas sem fim.
E, ao fazê-lo,
As pernas do meu pensamento
Singram alamedas, pontes, rodovias
Da beleza esconsa em cada esquina
Das múltiplas humanas vísceras.
Tais vísceras são heterogêneas ilhas:
Por isso penso-as
Opulentos jardins magníficos, putrefados,
Singelos, prosaicos, ordinários,
Rarefeitos, temperados
De surpresa e poesia.
Deixo-me eivar
Dos matizes da pungência de mazelas alheias:
Viro aidético e experimento
O acerbo sabor do desprezo;
Viro sertanejo e sinto-me presa
Das intempéries da seca,
Das promessas feitas pelos magos da falácia
Como também da eterna esperança acesa,
Que, no peito destes incríveis seres resignados,
Nunca se açaima, se tresmalha, se rende ao fogo do ocaso;
Assumo-me como negro que sou,
Permitindo que meu corpo seja envolto
Pelo manto danoso da aura da marginalização;
Assumo-me como índio que sou,
Sentindo o cultural genocídio varrer o meu chão;
Assumo-me como paralítico que sou,
Assistindo impotente á porta das oportunidades
Trancar-se por onde as rodas da minha cadeira vão;
Assumo-me como mulher, como idoso, como homo,
Como gordo, como um joão-ninguém,
Como uma pessoa fora do social padrão
E sou alvejado mortalmente pelo projétil da exclusão.
Afinal, regresso á minha velha rotina,
Impregnado do eflúvio da consciência
De que o mundo é feérico,
E o tornamos diariamente facínora e carrasco,
A mais dantesca mansão sangrenta!
JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA