Alguns acordes menores

Acordes menores elevam meu espírito.

Meu corpo na poltrona

e eu no infinito.

Descendo as cataratas num barril,

talvez menos melancólico

em manhãs de abril.

Quisera fosse sempre assim.

Enxurrada violenta

de lágrimas inúteis.

Inúteis passados refilmados.

Eu quis reter a sensação,

mas ela obteve o habeas corpus

antes de mim.

Vivo morrendo

em quartos secretos,

me esforçando para dormir

enquanto os versos se derramam

como faíscas no escuro.

Carnavais vão e vêm,

observações no calendário.

Pingüins de geladeira

– é rir para não chocar.

Tantos subterfúgios

nestes divãs elétricos

– novo derretimento estético –,

polimentos emocionais

dietéticos.

Benzemos nossas velas;

o sangue escorre da aquarela:

nada corre para meus braços.

Nada ocupa lugar no espaço.

Acordes menores.

Acordes menores.

Acordes...

Acorde...

Numa cidade abandonada,

os meninos assustados

fazem coro à minha sina.

Como posso ser mais um

quando não me ouvem

e não se fazem ouvir?

Acordes de discórdia.

(Sempre que posso me desvio dos relâmpagos;

na maratona das tartarugas dopadas

tenho esperança de vencer.

Jogo com honestidade,

mas retardaria o passo

para não lhe deixar muito para trás.

Eu mergulharia no abismo por você,

reescreveria minha história por você,

até amaria a mim mesmo –

logo não é minha esta corrente

em meus pés:

meus instintos engessados

levam tempo para emendar.

Mas um dia darei caça

ao ogro que engoliu a chave

da minha motivação.)

Idéia concreta, realidade mais digna de ser sonhada

– a localidade do sonho mais digno de ser realizado.

Onde?...

Nas ruelas, ruínas de futuras civilizações.

Retratos de uma paixão coletiva

há muito esquecida.

Mal sabemos o que corre esguio

entre as brumas acesas

pelos pactos subliminares,

nossa hora de maior assombro

– suburbano.

Acorde.

Acorde.

Acorde.

Oh...

Choro sobre a sua lápide,

sulcando num papel acetinado

um novo script plagiado.

Sinto o rangido da fissura hipocondríaca

enaltecendo a motivação cantante.

Nada corre para meus braços.

Choro entre as garças em formação,

planando ao sabor do alíseo,

contornando torres ruídas.

Varzeando solidões.

Cavalgo contradições de textos sacros

como que a oficializar sutis contracepções.

Nada corre para meus braços.