Um corpo
Em meio a trapos, entulhos e sobras
Um farrapo desprezado e sem rumo caído
Sem coragem, sem defesa e simplesmente ferido
A calçada escura e suja, sem asfalto, sem cor
Um corpo jaz sem coberta, sem pudor, sem amor
Passei e percebi que ele estava vivo e tinha ainda calor
Porque estava escondido em tão grande solidão
É que não havia motivo, nem razão e nem sentido
A coragem o tinha abandonado e pobre coitado
Está ali sem cobertor, sem orelha, sem estrada
Ele mesmo se aprisionou na tentativa ilusória
De frear sentimentos teimosos e resistentes
Na tentativa fugaz de controlar instintos carnais
Presos a algemas e correntes de promessas
Se entorpecendo de noites vazias, de sonhos adormecidos
Queria ficar sozinho, aquele corpo jazia sem dono, sem lugar
Foi então que num rompante eu o toquei e ele respondeu
Olhei em seus olhos profundos
E percebi que aquele corpo era o meu.