RETRATO DE MÃE

Autoria de Regilene Rodrigues Neve

Sobre o móvel

Teu retrato vestido de lembranças

Passa em memória da velha infância

Abraçando recordações...

Teu olhar de mulher guerreira

Traços fortes... Sentimentos frágeis...

Coração escancarado de amor

Transpondo o envelhecido retrato

De tantas memórias inesquecíveis...

A luta dia a dia sentida

Nas necessidades da sobrevivência

A carência sempre maior que os desejos

Os sonhos esquecidos de sonhar

Com tantos filhos para criar...

O sorriso sem sorrir a última alegria

A esperança em arrimo da alma

As lágrimas passageiras

De um olhar de infinita tristeza

Nas sombras das pálpebras envelhecidas...

Os maus tratos somando as rugas da tua idade

A felicidade uma relíquia guardada

Somente na alma... As vontades

Pretendidas sem pretensão alguma...

Partes intocáveis de um acervo de fotografias...

Retrato de mãe misturado de emoção

Em comoção de toda uma vida...

Tamanha luta pela sobrevivência

Deixou-nos o dissabor numa distância

Muitas vezes intransponíveis

O amor perdido nas necessidades maiores

Mesmo sabendo existir o amor de mãe!

Mas as seqüelas inevitáveis

Coabita no íntimo de cada um

Criando uma muralha entre nós

Numa relação mesquinha de afetos

Os gestos de amor engasgados no peito

Querendo gritar todo amor de mãe

Guardado em segredo

Estranho a própria vontade...

É a dor que dói mais doida

A perda em vida

De um amor nunca declarado,

Mas sabido mais que amado...

O tempo envelhecendo entre nós

A distância ainda longínqua...

Os abraços recolhidos

Ao léu da própria vontade

O medo contido no frasco de uma mágoa

Destilando a bebida do amor vida afora...

Aprendi a imitar tua força

A sentir tua coragem

A seguir tuas lições

Um caminho sôfrego de mãe

Que avisto no velho retrato sobre o móvel...

Mas ainda não consegui romper essa barreira

Que cala entre nós todo amor concebido

Em amor de mãe! Talvez tarde demais

Ele rompa as barreiras do silêncio

E grite o verso mais lindo

Que guardei para ti em segredo

Esse amor que reparto contigo em amor de mãe!

Sei que o tempo medita entre nós

E um dia cresceremos além desta ignorância

Que nos impede de abraçar todo amor

Contido em nossos corações

Ultrapassando o velho retrato de mãe!

Em 10 de maio de 2008