Anos dourados

Sou o pior dos sofistas

O mais desengonçado dos equilibristas

E o mais banal dos cronistas

Onde queres retidão me emociono

E se você quiser eu desafino, amor

Tento não enfebrecer

Azar no amor e no jogo

Vôo baixo, me revelo

Sonho sem cair no sono

Provo que o vermelho é quente

E que amor só presta louco, sem poupar

Giro a vida, invento sonhos que te fazem rir despreparada, e achar que há mais na terra

que só se falar pro nada.

Sou o pior dos sofistas

O mais desengonçado dos equilibristas

E o mais banal dos cronistas

Lembrei daquele do Poe, Barril de Amontilado

Fiquemos vigilantes então. É fácil se barricar,

Criar muros em si, e se esquecer do chão

Tijolinho a tijolinho

E sem que perceba dançar com fantasmas

de tecido branco e macio, que nos vestem mansos e calmos, numa afogação,

Daí se enterrar por completo

No terreno dos afetos

Sou o pior dos sofistas

O mais desengonçado dos equilibristas

E o mais banal dos cronistas

Desculpa a grande poesia

É árduo então isso de decompor

remontar a vida, toda vez, todo dia.

Nada passa incolume

Como mar sem fundura

Febre que não cura

E o chover de candura

Mas pode deixar que vou sim

escancarar as memórias,

olhar tuas cartas, tuas fotos, mirar o passado,

e suspirar em alto som

Como foram bons

Os meus anos dourados