O CASTELHANO NOGUERA

O castelhano Noguera era, para nós,

um completo e assustador mistério,

porque diziam que ele era comunista

e comia criancinhas assadas no espeto.

Morava num casarão de esquina,

tinha uma loja que nunca abria

e uma velha empregada,

que só víamos entrar, nunca sair.

Pelas frestas, com o coração na boca,

enxergávamos bicicletas e motociclos antigos,

peças de tecidos desmanchados pelo tempo

e teias de aranha que desenhavam fantasmas

no caderno de nossa imaginação.

Os anos passaram

e ele também passou,

veio uma senhora alta,

vestida de preto,

sua única e derradeira visita,

que, silenciosamente,

o levou.

E os segredos daquele casarão

nunca ninguém nos contou.