Permanências
O casarão onde nasci e morei, criança,
Sem nenhum risco de despejo, em mim mora...
Exala saudade...tudo são lembranças:
Seres, sons, cheiros...vivem em mim agora.
Vejo a cozinha, em alegre agitação,
Mas permanente nela a mamãe somente...
Inda os alpendres amplos...e nós irmãos
Bem felizes em folguedos inocentes...
Ouço, maravilhado, o mugir do gado,
Na apartação, do pasto recém-chegado,
Também o trinar do canário, o ano inteiro,
Dentro do curral, no olho do juazeiro.
Assim, o rouxinol feliz e vivaz,
Farto mensageiro e ágil bailarino,
Ruidosamente, excitante energia traz,
Respaldando os meus excessos de menino.
Cantiga da boêmia do sol intenso
Ecoa no sertão quase a "incendiar";
Os homens se queixam tanto, mas sem senso,
Porque ela, bem feliz, morre de cantar.
Nas madrugadas, galos em sinfonia...
Eu, na "rede-de-meio", já bem usada,
Aguardando, preguiçoso, a luz do dia
Que virá com a festa da passarada.
Permaneço ouvindo os galos do passado...
Despertam lembranças de sonho desfeito,
No cantar eufórico e sincronizado,
Pelas madrugadas...vivas no meu peito.
Lindos os alvos buquês do "pau-brancal",
Justapostos a horizonte em arrebol...
Sinto das flores perfume, sem igual,
Do mufumbo nas quentes tardes de sol.
Nítidas as noites de luar, tão belas,
Despejando a paz prateada nas matas
E o céu rico de cintilantes estrelas...
Vivas recordações na minh'alma...intactas!
Ah! permanecem vivas em mim agora
Essas memórias de tudo o que ali havia...
Pelo que nunca serão ilusões de outrora,
Mas vida feliz...à luz da nostalgia.
Sobral (CE), 25.04.2014
Sínteses de memórias da infância na Fazenda Paraíso.