De lá
De lá...
Por Fernando Silva
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Se me perguntas, direi sem demora
O que de lá me lembro, não tardo em dizer agora
Tem aratu, sarará e siri
Tem turú, amoré, não tem jabuti,
Tem garça, maçarico, taquirí maguari
Tem gaivotas, biguás, só não vi bem-te-vi...
Bem-te-vi, se me lembro há um só,
Mas este é gente,
Se não me engano, parente...
Se me perguntas, direi sem demora
O que de lá me lembro, não tardo em dizer agora
Tem na pancada caranguejo-feiticeiro,
Que flecha e deixa menino com febre
Tem igreja, tem barracão
Tem menino, menina,
Escola não tem não...
Tem gente que ensina,
Soletrar, fazer conta
E assinar o nome...
Tem amizade, intriga, paixão
A minha era Rosinha
De outro era Mocinha,
Coisa de menino querendo ser grande...
Tem roda, fogueira,
História de assombração
Chupa-chupa, Ataíde e pesadelo
Rasga mortalha, bacurau
Gente que vira bicho...
Se me perguntas, direi sem demora
O que de lá me lembro, não tardo em dizer agora
Se pesca de rede, espinhel, tarrafa e munzuá
Se pesca de flecha e anzol, curral e até puçá
Se pesca de muitas formas, na beira e em alto-mar
Só não se pesca dormindo
Sono é pra sonhar...
Lá de tudo se tem um pouco
Gente, bicho, canseira, diversão
Há quem cata sarnambi, tamarú, mexilhão
Há quem tire cutuca e caranguejo-uçá
Há quem trança palha,
Outros quem tecem redes,
Quem benza e quem faz canção...
Há quem nasce, quem cresce,
Quem casa, padece,
Quem chora,
Fenece....
Se me perguntas, direi sem demora
O que de lá me lembro, não tardo em dizer agora
Há no cenho uma marca do resistir, do sonhar,
Lugar pode haver melhor,
Não mais que aqui...
De tudo que me lembro
Só faltou o campinho, o poço,
A campina do Venâncio....
Mais nada resta agora
De lá, só lembrança...