Infância
Aquelas tardes da minha infância,
Plenas de sol e de cigarras!
Quando eu ficava horas perdidas
Olhando a faina das formigas
Que iam e vinham pelos carreiros,
No áspero tronco dos pessegueiros.
A chuva-de-ouro
Era um tesouro,
Quando floria.
De áureas abelhas
Toda zumbia.
O cão travesso, de nome eslavo,
Era um amigo, quase um escravo.
Merenda agreste:
Leite crioulo,
Pão feito em casa,
Com mel dourado,
Cheirando a favo.
Ao lusco-fusco, quanta alegria!
A meninada toda acorria
Para cantar, no imenso terreiro:
“Mais bom dia, Vossa Senhoria”...
Soava a canção pelo povoado inteiro
E a própria lua cirandava e ria.
Se a tarde de domingo era tranquila,
Saía-se sem rumo, em pleno sol,
No campo, recendente a clorofila.
Alegria de correr até cair,
Rolar na relva como potro novo
E quase sufocar, de tanto rir!
No riacho claro, às segundas-feiras,
Batiam roupas as lavadeiras.
Também a gente lavava trapos
Nas pedras lisas, nas corredeiras;
Catava limo e topava sapos
E alguns meninos enchiam copos.
Do tempo, só se sabia
Que no ano sempre existia
O bom tempo das laranjas
E o doce tempo dos figos...
Longínqua infância...
Plena de sol e cigarras!