Nome de flor

Ela era negra e magra.

Tinha as canelas finas,

os lábios carnudos,

os olhos arregalados.

Falava depressa,

puxando as palavras,

de uma só vez,

como se arrancasse pragas

da plantação.

Parecia temer o efeito

que elas causavam.

Eram sons ranhentos

como cabaças trincadas,

roçando entre si.

De vez em quando,

por lá aparecia.

Entrava pela casa,

os cabelos repuxados,

um jeito esquisito.

Tinha um trejeito

de balançar a cabeça ,

como se concordasse

com tudo da vida.

Queria ajudar.

Falava com mamãe:

— Quedê a cuié

pra quebá a cuaida,

pra mode fazê o quejo?

Mamãe falava:

— Ainda não é hora,

a coalhada está mole.

E ela perguntava:

— Quedê a bassoura,

pra mode barrê o chão?

Enfim se assentava,

no banquinho da cozinha.

Se benzia várias vezes.

O prato no colo.

Comia com as mãos,

ajuntando os montinhos,

apertando entre os dedos.

Os olhos baixos

num silêncio absoluto.

Enquanto mastigava,

com os poucos dentes,

os lábios se ajuntavam

como se fossem assoprar

as velas do tempo,

que perdidas estavam

de tantas que eram.

Parecia às vezes,

uma personagem qualquer,

de um livro da estante.

Mas ela era gente e tinha nome.

E nome de flor.

Déa Miranda
Enviado por Déa Miranda em 07/10/2013
Reeditado em 07/10/2013
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