QUERIA TER GUARDADO MAIS

queria ter guardado mais

do tempo

da vida

da alegria

dos momentos

as poucas lembranças cativas

enroladas na alma feito novelo

são pequenos tesouros

que não desenham mapas

vêm e vão quando querem

tocam-me como um sopro de brisa

dissolvem-se nas margens do corpo

busco nas altitudes uma nesga de passado

(por que será que se inclina a cabeça para trás

ao tentar recordar algo?)

a voz de minha avó

o aroma dos quintais da infância

o som da rua pela janela do apartamento

o sabor do refrigerante na estação de trem

o cheiro da boneca nova de vinil

a primeira vez frente ao mar

os risos no recreio da escola

a vertigem do primeiro beijo

a excitação das vésperas de bailes

o primeiro sorriso dos filhos

fontes remotas de imagens

sensações

espectros

da história que vivi

tudo se mistura e se perde

no remoinho do tempo

memórias deveriam estar acessíveis

lado a lado

como livros na estante

e não como pedras

perenemente empilhadas

umas sobre as outras

Helenice Priedols