Fora do tempo
Abro de súbito a janela
E eis que tenho saudades
De tudo que não mais vejo
Dói-me em cada página do tempo
Os cabelos grisalhos de minhas bisas
Coisa que lacrima os olhos é isso
Como um som antigo de realejos
Como um menino correndo atrás de pipas
Como a pureza perdida no primeiro beijo
Tenho saudades da brisa daqueles tempos
E apesar de todos meus atuais desejos
Queria sobre tudo tê-las ainda
Com seus ares sábios e serenos
Suas mãos de fadas envelhecidas
E agora, até eu que fui menino envelheço.
Não há mais lambe-lambes nas praças
Os bondinhos passaram há tampos
E os piões que giravam cantando
Suplantaram-se por tique-taques de ponteiros
Olhando pra fora do tempo
Ainda vejo Vovó
Fazendo seus bolinhos de chuva...
Olhando pra fora do tempo
Ainda vejo Vovó
Comendo batata doce em volta da fogueira...
Olhando pra fora do tempo
Ainda vejo Vovó
Contando estórias na cadeira da varanda...
Mas quando olho o agora
Cadê vocês minhas mães dos pais dos meus pais...