LEMBRANÇAS DE FAISQUEIRA II

(Faisqueira, vila de Ubaitaba/BA

Fatos acontecidos na minha infância e primeiros anos da minha juventude, sem ordem cronológica)

(continuação)

11

Chefe de toda festa, um bom na barbearia,

era Ariston Almeida, exímio cavaleiro.

Cavalgando em carreira, apeava da montaria

e pulava de volta a ela, muito ligeiro.

Certa vez, numa festa, ele, em cavalaria,

por força da bebida, era o mais façanheiro

até que, finalmente, ele perdeu o embalo

e, em castigo, beijou os rastos do cavalo. (11-08-1991)

12

Sebastião, adulto, e Gilberto e eu, infantes,

de estilingues nós dois e ele de espingarda,

fomos passarinhar nos matos verdejantes.

Sebastião na frente e nós na retaguarda.

De repente, um furor de mangangás volantes.

Bastião, a facão, se colocou em guarda.

Nós sumimos na moita enquanto ele lutava.

Só saímos de lá quando ele só restava. (12-08-1991)

13

Vendia no armazém, Manoel Hemetério,

genitor de Gilberto, acessórios de caça,

mas seu filho, o caixeiro, infante deletério,

a rodo os consumia, a um custo de graça,

atirando a valer, sem haver um critério.

Quando o Hemetério via a baixeza da massa,

o estoque reforçava e ficava contente.

Julgava que no caixa o lucro era valente. (13-08-1991)

14

Com o Tico e o Gilberto, um dia fui caçar.

Cada um com seu bodoque e seixos na sacola.

No chão, um bem-te-vi, vimos pronto a se alçar.

Tico, calouro, achou que a mira dava cola.

Sorrisos, Gilberto e eu, fizemos esboçar.

Tico nos praguejou e decolou a bola.

O alvo estava no chão, mas o seixo subiu.

O bem-te-vi voou, e no alto sucumbiu. (13-08-1991)

15

Salvador deu um tiro. Outro igual deu o Tico.

A caça do primeiro andava só no chão.

A caça do segundo alçava-se ao pico.

Rude era Salvador. Tico tinha a lição.

Salvador era pobre e Tico era rico.

Da caça que voou, Tico fez refeição.

Da caça que correu, Salvador não comeu.

Tico errou e acertou. Salvador só gemeu. (15-08-1991)

16

O velho Máximo era um simples artesão.

Palhas de bananeira usava em sua arte.

Certo dia vinha ele embaixo de um feixão.

Pôs-lhe fogo um malandro e se postou á parte.

Quando o inferno sentiu, deu o velho um pulão.

Fez um grande clamor, quase tendo um enfarte.

O povo, com amor, pagou seu prejuízo

e o velhote, contente, esfriou o juízo. (16-08-1991)

17

Faisqueira até tinha os seus débeis mentais:

Supriana, Gentil e mais o Coletão.

Coletão não de todo, e os outros, totais.

Só andava o Gentil, fechando uma só mão

e abrindo-a de repente em expressões astrais.

Gamelas, Coletão fazia quando são.

Mostrava Supriana o púbis a valer.

Só bastava ela ouvir de alguém: - Eu quero ver! (18-08-1991)

18

O Toninho Querino entrou num meretrício.

Pegou o xodó de outro e saiu a dançar.

A coisa ficou preta e ele viu-se difícil.

Puxou da arma e atirou para o outro se afrouxar.

Acertou-lhe na coxa e ao ver o malefício

para Minas fugiu, para ninguém o achar.

Da polícia de lá se tornou um soldado,

enquanto da de cá ele era um procurado. (18-08-1991)

19

Branco-róseo, alourado e com olhos azuis

Antenor Bonfim era o Alemão do lugar,

apelido que tinha e lhe fazia jus.

Na sua padaria ele ia madrugar.

Certa vez, lá, uma crioula se introduz

e começam os dois então a dialogar

como seres tantãs: - "Ô seu Alemães? - Hães?

- Aqui já tem pães? - Nães. Tem bulachães. Quer? – Nães”. (19-06-1992)

20

Conduzindo boiada, eu, João e o vaqueiro,

levava eu o bornal com a farofa nossa,

porém não sendo ainda adulto cavaleiro,

na sela o pendurei como uma coisa grossa

e o suor do animal nele entrou sorrateiro.

Quando a fome acordou o almoço era uma joça.

Ninguém quis almoçar, quiseram me espremer.

A fome ficou brava e o jeito foi comer. (21-06-1992)

(continua)

Almir Câmara
Enviado por Almir Câmara em 14/11/2010
Reeditado em 23/11/2010
Código do texto: T2615280
Classificação de conteúdo: seguro