VELHO RIO
Velho companheiro de aventuras.
Em tuas águas límpidas de minha infância
Me senti a mais feliz das criaturas.
Nadei sem medir esforço ou distância
Fiz meu leito em tuas brancas areias
Na calmaria da noite verão
Sonhei com doces e ardentes sereias
Em tuas margens de virgem mata
Descobri o prazer de amar sem cadeias
Tirei de tuas águas o peixe do dia
Dourado, pintado, traíra, tainha
Dourados que, carregar nem podia.
Que ofereci a minha rainha.
Rainha que se foi. Virou sereia.
Hoje choro por ti e por ela.
Molho de lágrimas a tua areia.
Na tua morte me cabe parcela.
Deixei que te poluíssem. Não fiz nada.
Olho tuas entranhas barrentas, sem vida.
Não singro mais tuas águas na madrugada.
Esta é a hora da despedida.
Tua morte sempre será lembrada.
Por que tenho uma ferida.
Encravada na alma arrasada.
Que um dia foi feliz em tuas águas.
Resta a paisagem desolada.
Sem sereias, sem anáguas
Apenas a saudade.
De um velho rio que naufraga
Vítima da crueldade.
Do ser humano, maldosa praga.
Sobre a obra
Voltando a minha terra natal, fui matar as saudades do velho Jacuí.
Levei um choque. Ao invés de suas antigas trilhas, ruas iluminadas, casas e águas poluídas. Esgoto! Meu rio virou esgoto. Águas barrentas, pesca predadora. Confesso que chorei. Acho que ajudei a tirar da água um dos últimos Dourados de 15 kg de que tive notícia. Eles não existem mais. Ali vivi os melhores dias de minha juventude. Agora só cabe a despedida. Ele está agonizante. Não terei coragem de voltar lá. Espero que este poema sirva para alertar aqueles que ainda acham que podem fazer alguma coisa. Talvez seja tarde.