A morte
A morte, formosa dama
Sempre espreita a nova vítima
Nunca pensei vivenciá-la com tanta intensidade
E só muito depois, descobrir sua presença
Aos poucos ela foi se encostando
No velho corpo de meu pai
Dama fogosa, sedenta de vida
No início, sorrateira
Sugando a cor de sua pele
O brilho de seus olhos
A força de suas pernas
O ar de seus pulmões
Oportunista, se aproveitava
Dos curtos passeios pela manha, e
Empoleirava-se sobre os ombros do pobre velho
Que ao peso da dama se curvava quase ao chão.
A filha atenta acudia-o e a dama esperta esperneava.
À mesa ela também se sentava
E nos talheres se assentava
Como era pesado levar até a boca
A imprevisível e horrível dama.
Assim ela foi se acercando
Disputando com as filhas o direito a presa.
Como não perde nunca
Resolveu pelo golpe final
E assim na madrugada
Chegou radiante e certa da vitória.
Não ajudaram as rezas
Não ajudaram as brigas
Acudir o pai foi difícil
Tão pesado estava o frágil corpo
Era a dama já deitada sobre a presa.