Minha casa própria

Ano mil novecentos e noventa.

Resolvi construir minha casa própria.

E não tinha nenhuma ferramenta,

E eu queria mesmo — de alvenaria.

Foi no período do “plano cruzeiro”,

No governo do presidente Collor...

Tive que destruir um cupinzeiro,

Que, p’ra mim, não tinha nenhum valor.

O indecoroso arrocho na poupança...

Mada e eu poupávamos em dólares...

Poupar, foi nossa única esperança;

Assim, sentiríamos novos ares.

Ao contratarmos um mau engenheiro...

Seu pessoal não sabia calcular;

E... Nós queríamos um bom pedreiro,

Que soubesse fazer ‘scada circular.

Na fundação, foi u’a longa confusão...

Ninguém sabia por onde começar!...

Vendo aquela triste e oprimida missão...

Eu mesmo, fui obrigado a calcular.

— Teremos que fazer uma sapata —

Bem funda!... P’ra sustentar as colunas!

Só não quero comprar um bate-estaca,

Somente p’ra fazer essas lacunas.

Nós queríamos um grande sobrado,

Que tivesse u’a estrutura a verberar

Com a acústica, um som equilibrado,

Por pessoas que soubessem operar...

Quando contratei aquele pedreiro...

Nem tinha noção do que ia acontecer...

O homem se queixava o tempo inteiro...

O que ele fazia — era me aborrecer!

Passava o tempo todo a examinar...

Mas, só examinar... A primazia

Do que tinha pra fazer — só se abanar!...

Reclamava do calor que fazia.

No fim de semana, toma lá, dá cá;

Era sagrado e não tinha o que dizer.

Tive até que comprar uma alavanca,

Mas, deixava tudo aquilo por fazer.

Um belo dia — vi todos dormindo...

Estavam de férias em minha casa!

Desse jeito — eu não era bem-vindo...

Muito menos, Mada — dona da casa!

Naquele dia... Tive uma boa idéia:

Eu mesmo poderia fazer meu lar...

Só precisava d’um empurrão na areia,

E ter muita vontade p’ra começar.

Então, tive coragem de extrapolar!...

Co’aquela verba gasta pros sonecas...

Compramos tudo em material do lar;

Cimento, tijolo, areia e placas!...

O acabamento já estava quitado...

Só faltava comprar a cobertura...

Pagamos tudo aquilo adiantado...

E mãos na massa — foi mor aventura!

Tive que aumentar a parte dos fundos...

Para que pudesse fazer um palco

Pro piano e o baixo que estavam imundos;

Imundos de poeira num socalco.

A fundação já estava quase pronta...

Só precisava fazer uns ajustes

Co’a parte que ficava noutra ponta,

Ligadas por um baldrame co’ fustes.

Comecei pela parte mais difícil...

A escada! Chamei o tal engenheiro

P’ra solucionar um problema infantil...

Esperei que me fosse conselheiro.

Quando fui fazer a bendita escada...

Aparecia um erro de metragem:

Uns degraus, pareciam arquibancada,

E não ficavam na mesma contagem.

Na medida, dezessete cm de altura,

Por vinte e sete cm pra ficar de base...

Os degraus não tinham a mesma estrutura;

Dois deles ficavam altos na face.

Cálculos e mais cálculos... E nada!...

Nada de solucionar o problema!

— “O pedreiro errou na rampa da ‘scada!”

Disse o engenheiro, depois d’um dilema.

Tentando me confortar..., ele disse:

— “Essa parede, também está torta!...

Não vai ser fácil, você atrever-se

A fazer todos degraus até a porta.

— Mas, não fique triste; isso acontece!...

Logo irá se acostumar co’esse salto!

Talvez, haja um problema no alicerce...

O terreno aqui, tem muito planalto!”

Na ‘spreita, descobri que o ignóbil

Tirara o diploma através de cobres!...

Resolvi fazer os degraus, mesmo inábil...

Vi que era capaz de mostrar aos nobres —

Como fazer!... P’ra reparar o defeito,

Desenhei cada trecho do ambiente...

Percebi o que tinha de ser feito:

Arrumar a parede, e bem ciente!...

Não restava mais outra sugestão!

Matematicamente, fui moldando

Cada milímetro — com precaução...,

E assim, fui formando e multiplicando!

Finalmente, consegui fazer os degraus!

O engenheiro e nem ninguém acreditou,

Como fiz p’ra bolar os noventa graus.

Um presente p’ra Mada, que s’encantou!

Quando cheguei na parte superior...

A Medusa — u’a cadela mais linda...

Já havia inaugurado com todo ardor —

“Dizia” p’ra Mada: — “Seja bem-vinda!”.

Esperei exatamente seis dias...

P’ra que ficasse tudo nos conformes.

‘Stava apenas começando as audácias —

Já tratei de comprar uns uniformes.

Agora, eu era mestre na construção...

Li sobre engenharia, noite e dia...

Até então, não tinha uma instrução,

De como erguer aquela alvenaria.

Logo apareceu u’a enorme obstrução...

Fui chamado ao fórum, a uma audiência,

Para resolver u’a enorme confusão,

Que o vizinho exagerou na exigência.

O mandado veio logo a desoras...

Para que eu tivesse que comparecer,

Pelo menos, em vinte e quatro horas,

P’ra embargar a obra no amanhecer.

Pensei em contratar um advogado...

P’ra retirar essa queixa maldosa,

Que o vizinho sentiu-se intrigado,

Por eu ter quebrado a parede rosa.

A velha casa era parede-meia —

Feita de argila e tijolo antigo...

Naquele tempo não usavam areia,

A solução foi fazer outro abrigo.

O perigo aumentava a cada dia...

Não havia mais conserto legal!...

E, p’ra fazer uma bela moradia,

Tivemos que sair da capital.

* Continua no próximo episódio!...

Paulo Costa (Pacco)

Pacco
Enviado por Pacco em 03/08/2009
Reeditado em 15/08/2010
Código do texto: T1734315
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