Lembrança bretã
O bosque tão verde se colore de vermelho
No amanhecer do solstício dos anos que não voltam mais
As praias tão negras, tão sóbrias,
Ao longe observam o caminhar agressivo dos anos
Em suas areias e pedras aonde freiras e monges tão altos, tão quietos,
Caminham em uma reza envolta nas névoas do passado
Uma lembrança que palpita na mente
Ao rever a ilha de Saint-Malo me devolve a vontade de chorar
E os castelos tão altos e imponentes
Que se espalham recortando as terras em reinos que não existem mais
Vão surgindo pelas estradinhas cercadas dos moinhos e vilas
As lembranças de repente voltam com a força de uma tempestade no mar
E me vejo sentado nas ruas de Nantes de olhos atentos nas nuvens
Por todas as cidades um passado, uma lembrança se esconde nas pedras.
Por onde os trovadores ecoavam suas cantigas
O cheiro agridoce das frutas e peixes nas feiras
As especiarias dos outros mundos que chegavam das barcas
Vejo-me atravessando as províncias num vôo leve
Vila por vila, pedra por pedra, bosque por bosque,
Onde lobisomens uivavam nas noites mais claras
E vampiros ressurgem das trevas distantes
Aqui nós ouvíamos lendas ao fogo da noite
Lendas de bardos e deuses que nos cercavam
Pedacinhos de memória que vamos guardar para sempre
Batalhas e campanhas que Joana D’Ark e outros viveram
Por muralhas que cortam as linhas da história
Caminhando pelos campos sem fim e por Morbihan
Carnac vem me dizer adeus ao longe no pôr enegrecido do sol
Em seu silêncio de mistério e paz
Sinto-me envolvido em lendas e saudades de tempos que não vivi
A Finisterre francesa no cabo mais distante
Mostra-me onde contemplo o limite do mundo antigo
Sobre as pedras escuras e inquietantes que nascem do mar
Onde os sopros dos anos esculpiram a terra caprichosamente
Tudo nos seus pequenos detalhes
Terra adentro os charcos e riachos criam desenhos e dividem mundos
As árvores lentamente trocam de cor no ciclo da vida do norte
Enquanto cruzo estradas, por caminhos tão distantes,
Tudo o que me resta são imagens quase apagadas
Perdidas nas histórias dos antigos
Em pedras e símbolos indecifráveis
Observo o horizonte com uma lembrança
Uma certeza que me trás de volta para estrada sem fim
E sigo em frente, rumo ao norte, numa saudade bretã.
Saudade que me leva pra longe, num devaneio além da vida.