NA MINHA RUA


Na minha rua
Se vendia manuê

E cambo de peixe
Onde passavam
Pescadores
De rio
Sonhadores
No frio
Das madrugadas 
Do Igaraçu
Amadores
De redes e anzóis
E de mulheres
Dos arrebóis

Na minha rua
Não tinha calçamento
Era cuscuz de arroz
Que se vendia
E a meninada
Faminta
No brinca
Se divertia
Na disputa do finca

Na minha rua
Não tinha esgoto
E nem bueiro
Só tinha areia
Areia fina 
Do aterro
Da inocência
Pelo descaso
Nem vê o erro
Que a rua ensina

Na minha rua
Dos meus dez anos
Jogava bola
Nem dava bola
Se tinha escola
Ou não

Na minha rua
Moleque esperto
Brincava à toa
Na linda lagoa
Lá da quarenta
Tempo de sobra
Não tinha dengue
E nem mosquito
- Isso eu não via!
Mas via o pato
Também o sapo
Peixe-mussum
Que eu pensava 
Que era cobra

Na minha rua
A gente brincava
Passava o tempo
Nem se lembrava
Quanta pobreza 
Estava em volta,
Mas tanta leveza,
Lembranças soltas
Trago comigo
Daqueles dias

Na minha rua
Que o tempo fez
Me afastar
Vem afagar
Minha memória
Não troco a rua
Daqueles tempos
Pelas de hoje

Mas creio, um dia
Vai ser possível
Àquela rua 
Poder voltar
Não a rua do espaço
Pois lá ela está, 
Mas a do tempo
Que a lembrança
Que me acalanta
E faz sonhar

 
Roberto Dourado
Enviado por Roberto Dourado em 19/12/2008
Reeditado em 21/05/2020
Código do texto: T1343955
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