MÃO CRIMINOSA

MÃO CRIMINOSA

2ª Edição Renovada

Este trabalho, retirado de um

“causo” do Folclore Brasileiro, foi

escrito pelo poeta titular deste livreto

como Peça Teatral em l978 e apre-

sentado em teatros de Carapicuiba,

SP, Brasíla-DF e Anápolis-GOIAIS

Em 1984/1985, transformado em fo

lheto de cordel, foi usado como bilhete

de rifa em Patos-PB .Em 1990 foi

escrito como um poema para os

jornais “A Crítica” de Manaus-AM e

“Tribuna do Sabugi” de Santa Luzia-PB.

Em 2002 o poema MÃO CRIMINOSA

volta à mídia, ao ser apresentado na

Rádio Cidade de Sumé-PB.

Somente agora um novo trabalho de

cordel reaparece, para os amantes

da arte poética

Santa Luzia, 02/02/2007

O Poeta.

Vou falar de um certo tempo

De tristeza e alegria,

Quando ônibus para o Sul

Ainda não se conhecia

E estradas pavimentadas

Só havia a Rio-Bahia.

Nos tempos que se viajava

Prá Mato Grosso e Goiás

Vendidos em “Pau-de-araras”

Como se fosse animais

E assim, muitas famílias

Iam e não voltavam mais.

Nesse tempo eu era jovem,

Sem responsabilidade

Desejei correr o mundo,

Fazer novas amizades,

E entre sessenta e setenta

Conhecí muitas cidades.

No ano sessenta e sete

Eu morava em Itaporã

No Mato Grosso do Sul,

Perto de Piraporã,

Foi aí que eu conhecí

Jesuino Jaçanã.

Jesuino era um mendigo

Que vivia embriagado,

Todo de preto vestido,

Barbado, sujo, rasgado

E entre outras desventuras,

De uma mão amputado.

Vivia em Itaporã

Mas era de Areado,

Se escondia numa mata

Bem perto do povoado

E só se ocupava em dar

Trabalho pro delegado.

Vivia pelas calçadas

Bebendo e contando prosa

Mas deixemos Jesuino

Com sua vida desditosa

Prá continuar a história

Triste da Mão Criminosa.

Um dia de tardezinha,

Isso na véspera de ano,

Me deu uma saudade louca

Do solo paraibano

Resolví tomar uns tragos

Prá esquecer o desengano.

Fazia um calor danado

Me banhei, troquei de roupa,

Fechei bem o meu barraco

Depois que “peguei a sopa”

E fui pro único bar da vila,

Chamado “Bar da Garoupa”.

Não era lá grande coisa

Mas até que era granfino,

Acerquei-me de uma mesa

E pedi um Rom Merino,

Chegou a ocasião

Que eu conhecí Jesuino.

Entrou tropeçando em tudo,

Já foi olhando prá mim,

Dirigiu-se pro meu lado

Naquele aspecto ruim,

Foi chegando e me dizendo:

“Dá uma esmola, chefim!”

Dei-lhe uma nota de dois

Olhando nos olhos seus

Achei extranha a maneira

Como ele me agradeceu,

Porque me disse: “Essa esmola,

Tu acerta lá com Deus.”

Disse isso e foi saindo

Tombando prá todo lado

E eu resolvi conversar

Com aquele desventurado,

Perguntei, “Como você

Pede esmola embriagado?”

Ele até zombou de mim,

Conheci pelo seu tom,

Porque logo respondeu-me

Em muito alto e bom som:

“Peço esmola embriagado

Do jeito que estou bom!”

Ignorando a resposta

Perguntei: “Por que você,

Já que precisa pedir,

Começa logo a beber?”

Me respondeu num muxoxo:

“Eu bebo prá esquecer.”

Eu então continuei:

“Você bebe pelo vício.”

Todo bêbado fala assim

E termina no hospício.

Mostrando o braço ele disse:

“Bebo prá esquecer isso!”

Foi então que eu notei

Que lhe faltava uma mão,

Perguntei: “Foi trabalhando?”

E ele, olhando pro chão,

Respondeu quase chorando:

“Num foi trabalhando não!”

Continuando a resposta

Ele disse amargurado:

“Nunca trabalhei em nada

E nem fui acidentado,

Foi capricho do destino

Cobrando um grande pecado.”

Perguntei: “Não quer contar-me?

Ajuda a gente esquecer.

Desabafe suas mágoas

Que eu tento lhe compreender.”

Ele disse, “Eu choro muito

Se contar prá vosmicê

Só conto a minha história

Se estou muito embriagado,

Porém se o senhor pagar

Uma pinga presse coitado,

Vai conhecer a história

Mais triste de todo Estado”.

.

E nesse “chove-não-molha”

Ainda tomou duas canas

E começou a contar-me

A sua sorte tirana.

Era contando e chorando,

Com seu coração em chama.

Chorando ele me contou:

“Eu desde pequenininho

Nunca fiz uma boa ação,

Fui sempre muito mesquinho,

Por mais que mamãe tentasse

Eu só via o mau caminho.

Não tinha nenhum amigo,

O meu amigo era o cão,

Esta mão que está faltando

Foi fruto da tentação,

Foi um pecado tão grande

Que nunca terei perdão.

Um dia à “boca-da-noite”,

Mamãe chamou-me àtenção:

“Meu filho, mude de vida,

Não faça mais judiação,

Vá à igreja, se confesse

E receba a comunhão!

Veja que eu vivo sofrendo

Prá te tirar da cadeia,

As famílias nos evitam,

Deixe dessa coisa feia,

Todo mundo aqui trabalha,

Você só vive na peia!”

Não gostei de está ali

Por mamãe sendo ralhado.

Prá que não mais continuasse

Com aquele ‘Papo-furado”

Lhe dei dois tapas na face.

Foi meu último pecado.

Ajoelhou-se e caiu,

E começou a chorar,

Contrito, pedi perdão,

Ela quis me perdoar,

Mas sua voz sucumbiu

Para nunca mais voltar.

Ainda tocou-me o rosto

Com seus dedos delicados

Porém seu braço caiu,

Já mole e desgovernado.

Morreu de tanto desgosto

Por ter do filho apanhado.

Passei a noite chorando

Sem ter mais consolação,

E na hora da partida

Enlutou meu coração.

Ela deu-me a despedida,

Só não pôde dar o perdão.

Fui perdendo meus sentidos,

Sofrendo a desgraça minha,

Fiquei um louco varrido

E agarrei a machadinha.

Vendo a mais triste desdita

E com uma força esquisita...

EU CORTEI A MÃO MALDITA

QUE MATOU MINHA MÃEZINHA!!!

DESCENDÊNCIA

Eu tenho na minha casa

Um papagai faladô

Bicho de pena e de asa

Num pode ter mais valô,

Conversa com os animá

E adispois vem me contá

Tudo que os bicho falou.

Mas previno a vosmicê,

Não gosto de labacé

Por isso quero dizer

E acredite se quiser:

Por favor, nunca espái

Conversa de papagai

E fuxico de muié.

Meu papagai asto dia

Voando vei me contar

Que um macaco véi dizia

Prá todos os animá

Que em defesa do seu nome

Ia movê contra os home

Uma ação judiciá.

Meu papagai disse enfim

Que esse macaco feroz

Dizia pros bicho assim

Com toda artura de voz

Prá vergonha dos macaco

Diche um sujeito veiaco

Que um dia nasceu de nós.

Mas nenhum de nós aceita

Na famía essa breiada

Nossas macaca é honesta,

Muito honesta e respeitada

Por isso que eu duvido

Que os home tenha nascido

No meio da macacada.

Veja bem se argum de nós

Somente por ambição,

Guarda argum rancor feroz

Matando seu próprio irmão.

Seja ele forte ou fraco,

Macaco contra macaco

Nunca fez revolução.

Animá nenhum da terra

Tem o instinto dos home

De viver fazendo guerra,

Matando os outro de fome,

Entre nós há união

Sem haver exploração,

Aonde um come outro come.

.Também as nossas macaca

Não deixa os fios com fome

Nem arruma sua mala

E pelo mundo se some

Atrás de outro chimpanzé

Como faz certas mulher

Fugindo com outros home.

Porém nada disso importa

E prá falar francamente

Enfim, nós só não suporta

É a mentira dessa gente

Que prá manchar nosso nome

Quer por força que esses home

Seja nossos descendente.

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 29/06/2008
Reeditado em 02/08/2014
Código do texto: T1056288
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