O PRÍNCIPE CEGO 9 E 10

O PRÍNCIPE CEGO IX – 21 ABR 2022

O comerciante afastou-se, balançando

a cabeça ao pensamento de sua morte

e Milovan pagou a terceira aposta...

“Ainda não te dás por convencido?

“Tuas apostas injustas foram me roubando

tudo o que eu tinha para enfrentar a sorte...

Sem dúvida, tudo isto me desgosta,

ganhaste de mim um dinheiro mal havido!”

“Ora, maninho, por que fostes apostar?

Não vais dizer que a Injustiça te obrigou!

Foi resultado de teu excesso de confiança.

Estou com pena, mas não pretendo devolver,

só que outra chance agora vou te dar.

Por esse belo cavalo em que montou

te darei trezentas moedas de fiança:

a última aposta poderás ainda vencer!...”

“Jogo seiscentas moedas contra o teu cavalo

e podes indagar de outro passante,

alguém que possa te despertar confiança,

que manifestar se irá pela Justiça!”

“Mas se eu perder, não mais posso montá-lo!”

“Pode virar a sorte, já te maltratou bastante,

indaga de algum padre ou de criança,

quem sabe ainda não acreditam na Injustiça!”

Feita a aposta, logo um monge apareceu.

“Não te serve esse aí? Um homem de Deus,

por certo crê na Justiça Divinal...”

Fizeram o monge parar pacientemente,

que logo à mesma pergunta respondeu:

“Foi por grande Injustiça que os Judeus

Jesus tornaram em vítima, afinal,

mesmo que o sacrificio fosse apenas aparente.”

“Mas de pouco ou nada isso serviu ao mundo,

sempre foram perseguidos os Cristãos,

até que o Imperador Constantino os protegesse,

mas a Injustiça entre nós permaneceu,

o mal que existe nos homens é profundo,

são assassinos, são ladrões sem remissões,

toda a Graça de Deus a gente esquece,

toda a Justiça para os homens se perdeu!”

O PRÍNCIPE CEGO X – 22 ABR 2022

E lá se foi o monge em seu caminho,

pediu uma esmola, porém nada recebeu,

Milovan já não dispunha de mais nada

e Goyko lhe disse: “Vai com tua Graça!

Seria injusto que eu trate com carinho

alguém que a Injustiça firmemente defendeu!

Desmonta agora, Milovan, de minha montada,

Até lamento por toda a tua desgraça!’

“Bem, vou voltar ao castelo, está na hora...”

“Mas, irmão, vais me deixar aqui, sem nada?”

“Os teus olhos te mostrarão por onde andar,

ou queres fazer mais uma aposta, sem demora,

antes que eu dê a volta e vá-me embora?

Os teus olhos contra a riqueza já apostada?”

Milovan já de seu cavalo fora desmontar,

uma caricia final a dar em sua bela espora...

“Mas como poderei viver sem olhos?”

Goyko soltou uma estrondosa gargalhada

e com o punhal furou-lhe os dois olhos depressa.

“Mas eu não fiz essa aposta, meu irmão!”

”Cobre tua face com um par de antolhos,

que a Injustiça foi toda agora comprovada!

Em nossa vida é o Mal que jamais cessa,

vai esmolar, talvez tenham compaixão!”

O que o pobre Milovan nunca soubera,

é que aquela hora da noite os viandantes

simplesmente pela estrada não passavam!

Fora de fato Gryass, o espírito maligno,

que disfarçado em cada figura ali viera

e ns bocas dos supostos viajantes

botara as tristes palavras que falavam:

o que poderia haver de mais indigno...?

“Meu irmão, não me deixes aqui cego!”

“Por que não? Maior será a Injustiça...”

“Escuta apenas, há uma fonte ali adiante,

leva-me ao menos até lá, para que possa lavar

as minhas feridas em seu límpido rego

e encher meu cantil para essa dura liça!”

“Está certo, a Injustiça ainda é constante,

pela Justiça nem poderia te ajudar!...