NASREDDIN-HODJA E ZALINA
NASREDDIN-HODJA E ZALINA I – 23 JUN 2022
Em uma cidade da Macedônia, há longos anos,
vivia um velho turco, por nome Nasreddin,
muito versado em dar golpes profanos,
que como “Hodja” fora apelidado assim, (*)
que por Hodja se chamavam os ciganos,
espertalhões, saltimbancos ou arlequim,
que facilmente aos outros iludiam
e certa vantagem sempre conseguiam...
(*) Talvez modificação de “Hajji”, titúlo dos peregrinos,
mas a história não refere que ele tenha ido a Meca.
Toda a sua renda provinha de um pomar
e de uma horta, que dava em profusão,
mais que o necessário para o sustentar
e à sua mulher Zalina, porém, cada verão,
chegava o coletor do Emir, impostos a cobrar,
mesmo além do que lhe rendia a produção;
e com esperteza, buscava então lucrar
algumas dracmas dos moradores do lugar.
Mas nem sempre era ele o mais esperto,
que alguns havia a querer dele troçar;
certo dia se queixou, de peito aberto,
que precisava de oito burros para negociar
com o comércio de sal pelo deserto,
mas que dinheiro não teria para os comprar
e que na aldeia ningém nele confiaria,
nenhum jerico lhe dava ou emprestaria...
Um certo dia em que se achava a iamentar,
na esperança de comover alguns vizinhos,
dizendo mesmo que só queria alugar,
ao menos três ou talvez quatro burrinhos;
mas quem os tinha declarava precisar,
que iriam sofrer ou passar fome nos caminhos;
teria de pagar o aluguel todo adiantado,
em boa prata ou dinheiro de contado.
Então um dia, enquanto assim se lastimava
e procurava algum vizinho convencer,
entre o povo que indiferente o escutava,
havia um rapaz que conseguira vencer,
em certo jogo, no qual diziam trapaceava,
com alguns truques que ninguém podia ver;
ao tal rapaz ele enganara ainda criança,
que agora adulto planejava a sua vingança.
NASREDDIN-HODJA E ZALINA II – 24 jun 2022
“Mas, meu amigo, por que não me procurou?
Posso vender-lhe de burro umas sementes!”
Todo o povo da aldeia se espantou,
nunca burrico plantado viram tais gentes!
Mas quando Nasreddin o chamariz até aceitou,
já começaram a se rir por entre os dentes,
logo entendendo ser tremenda falcatrua
e já a malícia a correr por toda a rua!
“Eu nunca ouvi falar de sua existência,”
falou Nasreddin, um tanto desconfiado.
“Bem, não se encontram com muita frequência:
são sementes maravilhosas, grande achado,
que meu tio me enviou de sua querência,
porém não tenho um terreno a ser plantado,
desse modo, eu lhe vendo dúzia e meia,
por vinte dracmas de prata de boa veia...”
“Seria até interessante, mas não tenho
vinte dracmas, nem ao menos a metade;
caso as tivesse, no maior empenho,
as compraria com toda a boa vontade...”
“A razão por que as sementes não retenho
é que precisam ter de macieiras a umidade
e me parece que em todo este lugar
só o senhor que é dono de um pomar...”
“Se plantar à noite, ao pé de uma macieira,
pela manhã já nasce um burro pequeninho,
que vai buscar entre a serapilheira (*)
maçãs caídas e cresce rapidinho!
É um investimento de razão certeira,
de cada semente nascerá um burrinho,
pois são sementes encantadas, realmente,
maravilhosas e de produção frequente!
(*) As folhas e galhos caídos entre as árvores.
Infelizmente, não tenho esse dinheiro,”
disse Nasreddin, não muito convencido.
“E se tivesse, iria alugar primeiro
qualquer burrico que já tenha crescido...”
“Pois então, compre oito e bem ligeiro,
cada bichinho sendo bem nutrido,
irá crescer até o tamanho ideal,
para levar essa sua carga de sal!...”