AMOR AOS DOZE ANOS

Um daqueles amores,

dos que sempre acertam,

e por isso mesmo,

quis me surgir assim:

em minha escola,

no primeiro dia,

dentro da sala

do oitavo ano.

Meu amor agora vive ali.

Vive

e para o meu encanto,

senta na segunda cadeira

da primeira fila

ao lado da janela,

está presente na chamada,

e nem rabisca a lousa.

Eu o vejo tanto

que naquela prova

de matemática

meu amor saiu antes,

saiu para que eu soubesse:

amor

ao se multiplicar,

não precisa provar

e nem aparecer,

pois ele surgirá depois,

no fundo do pátio,

quase na saída,

perto da esquina,

ou no fim da rua.

Amo,

e não quero

que o meu amor sofra,

por examiná-lo assim.

Meus olhos se esticam

até o seu pescoço,

até os seus cabelos

e os outros notam

e talvez zombem,

deixando-me nervoso,

por estar errado,

quando sei que amo;

quando amar

é quase perceber:

o amor pode se transformar;

ter outro rosto

pra você reconhecer.

Digo isso porque ontem,

eu me distraí

e o meu amor grudou

um “piercing” dourado,

na ponta da língua.

Agora ele parece mascar

um chiclete diferente;

mastigar um pedaço

da própria orelha;

e parece também um amor torto,

pois vejo em cada lóbulo

um brinco

em formato de caveira.

O meu amor se dobrou

se misturou,

mas sei que por isso mesmo,

por este amor me entortar tanto,

meu amor,

um dos que sempre acertam,

acertou em mim

Do livro: "A criança, substantivo sobrecomum"

Paulo Fontenelle de Araujo
Enviado por Paulo Fontenelle de Araujo em 06/04/2018
Reeditado em 21/04/2018
Código do texto: T6301008
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