Abono

Chorou tão baixinho, soluçou tão sozinho...
Chegou quase perto querendo carinho.
Coração aberto, chegou de mansinho
com escorridas lágrimas
tão soltas, caindo ao léu, escondidas...

O peito choroso, no seu pijaminha,
um ar carinhoso naquela roupinha...
Um tanto nervoso, chegou de mansinho,
nas meias da noite, para o seu Boa noite,
falando baixinho, querendo carinho...

Chegou quase perto, no meio da luz...
Não falou quase nada do amor que levava
nem da sua cruz...
No meio da sombra, na esquina da sala,
esperando um açoite muita coisa ele cala...
Mas fala: Boa noite!

Boa noite, meu filho! Que Deus o proteja!
Apenas dez anos, quieto, sereno,
parece com sono. Nos olhos um brilho
pedindo, no gesto do seu abandono,
um pouco do resto que fosse o abono
pela rebeldia dos seus poucos anos.

Na aura de carinho que exalava
o Boa noite sozinho muito mais falava
naquele anjinho. Esperei o Boa noite, pai
no seu complemento.
O pai que não veio naquele momento.

Dois segundos foram o bastante para ler
em toda a sua alma tudo que não disse:
-Papai, estou triste. Bem aborrecido com você.
Eu sou criança, mas não tão criança assim...
Até sou rebelde...
Sou rebelde, mas quero que entenda
a pessoa que sou. Não me interesso,
eu sei, pelas coisas difíceis que fala...
Mas é porque não as compreendo ainda.
Estou aborrecido, só eu sei porquê.
Mas sei que você me quer bem!
Não se aborreça comigo.
Eu quero a sua benção.
Apesar disto, não seja nazista:
Eu te amo também!


As duas palavras ditas
não disseram somente isto:
elas falaram do amor do pai e do filho...
elas libertaram as nossas almas,
naquele infinitésimo momento,
que se beijaram, acariciaram,
se abraçaram...para sempre!