O ARMÁRIO

Irão desmontar o guarda-roupa da vovó.

(guarda-roupas vêm do Pleistoceno,

somente os armários

são do período Jurássico).

Irão desmontar o armário da vovó.

Oitenta anos se passaram,

e ele ocupa o mesmo lugar

com suas oito gavetas profundas

para dispor medos

e lenços de seda.

Irão desmontar o amigo da vovó

Seu enorme espelho olhava

os meus três anos de idade;

tudo refletia

até que decorei algo: “meus olhos”.

E também aprendi havia uma boca,

havia o nariz, os dentes

e escutavam meu coração,

batia no fundo daquele guarda-roupa

que antes era um armário

porque ocupava o quarto Jurássico,

onde os dinossauros tremiam em algum lugar.

Mas irão desmontar o armário de vovó,

ocorreu que semana passada

o enorme espelho quebrou,

quebrou tanto que o móvel não disfarçou

e parou

tornou-se algo como um guarda-roupas,

uma montanha

ao lado da cama,

imóvel como a cara de uma colina,

grave como uma preguiça gigante

deitada ao lado da cama...

E assim, de repente,

- porque algo começava a acordar -

decidiram desmontar o armário,

agora era guarda-roupas da vovó,

um monstro.

DO LIVRO: "O ÚLTIMO FOGUETE"

Paulo Fontenelle de Araujo
Enviado por Paulo Fontenelle de Araujo em 01/06/2017
Reeditado em 11/02/2022
Código do texto: T6015115
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