UM ÍMPIO

Vi um ímpio qual erva verde

Vicejar por toda a terra;

Sorvia a largos goles,

Do copo que se lhe dera;

Era altivo e soberbo,

E se dava por seguro;

Dizia não ter medo,

E que confiava no futuro;

Levantava a vós aos céus,

E falava com insolência;

Pra ele não existe Deus,

Não tem temor e nem ciência;

Congrega as suas cabras,

E se impõe como pastor;

Come o leite e as carnes delas,

E ainda pisa o que sobrou;

Não fortalece a fraca,

A doente não cura,

A desgarrada não busca,

E da gorda se empanturra.

Prometendo-lhes liberdade,

Engoda as almas inconstantes;

Aquelas que se afastavam

Daqueles que são errantes;

Seus filhos são nédios,

Tem no coração fantasias;

E não sabe que é néscio,

E não tem sabedoria;

Muda em mentira a verdade,

E não cogita da justiça;

Tem dizeres de vaidade,

E se fortalece na mentira;

Muda os estatutos

E perverte o direito;

Come qual um bruto

E não fica satisfeito;

Não há temor de Deus nele,

Nem conhecimento do altíssimo;

Não se humilha nem se arrepende,

Nem cogita do juízo.

Esses são ímpios,

E vivem em segurança;

Eles são malditos,

E sem bem-aventurança.

Eles não herdarão a terra;

Aos justos ela será dada;

Pois que por sua causa

Pranteou e se murchara.