ASPIRAÇÃO DE CONSCIÊNCIA

eu queria

rasgos na pele já ferida pelo látego fustigar

e no meio-tempo alegria

sentir tristeza, mostrando lágrimas sangrentas

cristalizando-se nas fendas

da face...

aguçadas pontas de espinhos incomodam

atravessando

o livre curso de meu pensamento maduro;

coroa de louros espinescida

enfeitando minha cabeça de poeta e mestre

entre véus encarnados

de dores...

perder o dom de respirar,

o salário de todo meu viver,

subtraída por Deus, o perfume da vida,

ao perceber

minha responsabilidade, peso insuportável

do mundo sobre minhas costas – que por sinal

não é o torso de Atlas –

e todos os corpos lenhosos

esmagando-me com odor de clorofila...

pretendo ouvir sons

de martelo que arranca dores nos pregos;

aço rompendo músculos,

nervos e ossos...

sentindo a ausência de Deus

vejo o sinete da dor carimbar meu espírito,

e ouvir zombarias;

sarcasmos que ferem mais que açoites...

seria mais amável, respeitoso a mim,

a glória de padecer;

não de arrancar meus pensamentos...

queria estar no bojo de grande moinho;

e é desejo contumaz

ver sobre minha massa

as engrenagens passando:

solidão, temor, fraqueza e agonia...

e ainda assim pudesse eu retirar,

mesmo com força sobrenatural,

gotas de sangue:

rosas vermelhas de suor...

ambiciono

no meu meio-tempo sorriso

ouvir o som da lágrima

entre seu rolar pelo caminho da alma,

chorar, molhando

minha face de pedra.

que a claridade alegre que o dia traz

fumarada fosse pelas trevas

e meu temor aflorasse

como se abalam as entranhas da terra...

quero, enfim, encontrar

no meu meio-tempo felicidade

pelo menos um sofrer mínimo

no lugar do Mestre de Nazaret.

Rocha Poema
Enviado por Rocha Poema em 01/06/2012
Código do texto: T3700141
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