Cântico - Solidão do Amado
No ermo sagrado, a alma se esconde,
Ferida e sedenta de ardor;
Oh mistério divino, que tudo responde,
Na noite do nada, és todo o meu Amor.
Caminho sem passos, silêncio fecundo,
Treva que brilha com fogo de Alguém;
No véu do vazio, transcende este mundo,
E nele me encontro perdida em teu Bem.
Oh chaga invisível, dulcíssima espada,
Que rasga a mortalha do ser e do eu;
Na morte do ego, minh’alma incendiada
Contempla o eterno que em tudo nasceu.
Amado que chama, voz inaudível,
Tens lábios que falam a essência do ser;
Por ti a minh’alma se faz indizível,
Rendida ao mistério que é ver e não ver.
Que importa o deserto, a ausência sentida,
Se em ti, solidão é íntima união?
Na dor deste exílio, já sou redimida,
Pois tua presença é meu coração.
Oh Noivo que espera, no abismo profundo,
Minha sede és Tu, meu céu e lugar;
Na noite infinita que envolve este mundo,
És tudo, e em tudo me vens abraçar.