Funeral da margarida
No início da tarde, o sol sempre invade a velha varanda.
Com muita preguiça, o gato se espicha e vira de banda.
A flor da roseira plantada na beira, perfume exala.
Sinhá Margarida, já entardecida, pensa e não fala.
Solta um gemido; ego ferido, mazelas do corpo.
O gato se arrepia, levanta e mia, sai olhando torto.
Margarida, metade da vida, viveu sobre a cama.
É tanto trauma naquela alma que aumenta o drama.
O sol que enfraquece e não aquece, vai se descambando.
Sem luz e calor, carente de amor, ela está pensando;
Olhando ao redor, tem visão maior, dá um passo à frente.
Confusão mental em um funeral tão cheio de gente.
Entra na sala e ouve as falas dos sentinelas.
Um assunto sobre defunto, à luz de velas.
Os choros, os desaforos e os louvores;
Reprovando tudo, é absurdo. Coroa de flores.
Triste vida Margarida; flor e espinho.
Ela diz baixinho: "Que povo mesquinho!"
Durante o cortejo há um lampejo de sobriedade.
Inesperadamente, ela sente a fatalidade.
Olha amiúde naquele ataúde; é ela mesmo, ali.
Sente-se mal porque, afinal, caiu em si.
E Margarida está decidida, não vai aceitar.
Foi designado um anjo sagrado para acompanhar.