Morada Celestial (Meu tributo a João da Cruz e Sousa)

Lá, no negrume etéreo das jornadas,

Onde os anjos antecedem aos mortais;

Lugar, que dos deuses são moradas,

Regiões celestes dos tronos de cristais!

Lá, no vasto sideral espesso e místico,

Do cosmo gasoso, infinito e fulgurante;

Floresce a paz de um mundo cabalístico,

Uma dádiva de Deus, sublime radiante!

Lá, na plenitude deste mundo sideral,

Do sagrado fogo, do amor divino santo;

Dos desejos d’alma, do celeste abrigo,

Habita a plenitude, soberana e imortal,

Com as luzes gloriosas de um encanto,

Etérea plaga, sem pecado, sem castigo...

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João da Cruz e Sousa nasceu em Desterro, atual Florianópolis, capital da então província de Santa Catarina, no dia 24 de Novembro de 1862. Era filho dos negros alforriados, Guilherme da Cruz, mestre-pedreiro, e Carolina Eva da Conceição. Portanto trazia consigo, o sangue sem mescla de suas raízes africanas. Mas as circunstâncias proporcionaram para que Cruz e Sousa fosse amparado na infância, por uma família de linhagem fidalga, onde recebeu a tutela e uma educação refinada de seu ex-senhor, o Marechal Guilherme Xavier de Sousa – de quem adotou o nome de família, Sousa. Amparado por essa família, estudou francês, latim e grego, além de ter sido discípulo do alemão Fritz Müller, com quem estudou Matemática e Ciências Naturais.

Nos seus trinta e seis anos de existência, peregrinou por todo um período de experiência de agruras e sofrimentos. É claro que pelo fato de ser negro em sua época, o sofrimento fora ainda maior. Em 1881, dirigiu o jornal Tribuna Popular, no qual combateu a escravidão e o preconceito racial. Em 1883, foi recusado como promotor de Laguna.

Em 1885 lançou o primeiro livro, Tropos e Fantasias em parceria com Virgílio Várzea.

Após longas peregrinações pelo norte e sul do país, aportou na cidade do Rio de Janeiro, onde trabalhou como arquivista na Estrada de Ferro Central do Brasil, colaborando também com o jornal Folha Popular. Em Fevereiro de 1893, publica Missal (prosa poética) e em agosto, Broquéis (poesia), dando início ao Simbolismo no Brasil que se estende até 1922. Em novembro desse mesmo ano casou-se com Gavita Gonçalves, também negra. Viu a mulher enlouquecer, pelo fato de seus quatro filhos morrerem vítimas de tuberculose. Sofreu miséria, amargou ultrajes.

Morreu a 19 de Março de 1898, na cidade de Sítio, Minas Gerais, para onde fora levado as pressas vencido pela tuberculose.

Escrevi Morada Celestial, inspirado nesse ilustre poeta, um de meus prediletos.