A Esmola Que Nunca Esqueci...
(Opinião poética sobre o tema "Esmola, dar ou não dar?")
Década de 60. Menino ainda, de sonhos cheio,
eu chegava à selva de pedra chamada Rio de Janeiro...
Neurótico e angustiado, era, entretanto, um exegeta
ignorante das fraquezas da alma. E não sabia também
que a nossa vida não passa de uma simples roleta:
Dias, meses e anos, ela vai e vem, vai e vem...
Assim, apesar de uma infância pobre e triste,
eu encarava com muita severidade, dedo em riste,
o ato de pedir! E como quem com nojo socorre
um leproso, mísera moedinha em mão sem nome
lançava, pensando que, como quem não come morre,
era certo dar esmola, mas apenas para matar a fome..
Ano de 1973. Jogado na sarjeta da vida, em Fortaleza,
vida e alma estraçalhadas pela extrema crueza
de uma avassaladora dependência química, eu sorvia pura
angústia em insanos goles, sem sonhos, sem mais nada,
pois, inebriado pelos vapores do álcool e da loucura,
afundava-me no peso da minha desgraça engarrafada!...
Numa manhã, na Praia do Farol, depois de louca
noite de embriaguez, acordei na praia, só com a roupa
do corpo, sem documentos, sem dinheiro, mas somente
dominado pela compulsão desesperada de tomar
o primeiro gole! Meu Deus, como era tão premente
aquela ânsia... Eu precisava de novo me embriagar!...
Entrei num boteco, trôpego, mãos trêmulas, semblante
desfigurado pela compulsão, e, com voz hesitante,
falei para o dono do bar: “Amigo, sei que é mole
Esta desculpa, mas um favor me faça:
não tenho dinheiro, mas preciso de um gole!
por favor, pode me dar um copo de cachaça?”
O debochado sujeito, com um sorriso galhofeiro,
respondeu: “Nada feito, cara, aqui só a dinheiro!”
Invadiu-me um desespero imenso, ao receber
a humilhante recusa. Precisava tanto daquele trago!...
Abatido, já ia retirar-me quando ouvi um rapaz dizer:
“Cara, dê uma garrafa para ele. Eu pago”!
Minha vida, que já deu um romance, daria mais?
Pode ser! Mas, quantos escreva, aquele rapaz,
que não me deu emprego, dinheiro ou alimento,
é um personagem que me desperta gratidão de verdade.
Era uma simples garrafa de bebida, mas, naquele momento,
aquela garrafa continha o meu sonho de felicidade!
Anos depois desse fato, do AA recebendo a mensagem,
tampei a minha garrafa e reabri a alma. A minha homenagem,
pois, a esse rapaz, não é pela droga psicoativa que tal
garrafa continha e que para mim hoje nenhum valor tem;
é porque, quando eu pedi a esmola, ele a deu, incondicional,
sem se importar com “o quê” ou “a quem”!
(Opinião poética sobre o tema "Esmola, dar ou não dar?")
Década de 60. Menino ainda, de sonhos cheio,
eu chegava à selva de pedra chamada Rio de Janeiro...
Neurótico e angustiado, era, entretanto, um exegeta
ignorante das fraquezas da alma. E não sabia também
que a nossa vida não passa de uma simples roleta:
Dias, meses e anos, ela vai e vem, vai e vem...
Assim, apesar de uma infância pobre e triste,
eu encarava com muita severidade, dedo em riste,
o ato de pedir! E como quem com nojo socorre
um leproso, mísera moedinha em mão sem nome
lançava, pensando que, como quem não come morre,
era certo dar esmola, mas apenas para matar a fome..
Ano de 1973. Jogado na sarjeta da vida, em Fortaleza,
vida e alma estraçalhadas pela extrema crueza
de uma avassaladora dependência química, eu sorvia pura
angústia em insanos goles, sem sonhos, sem mais nada,
pois, inebriado pelos vapores do álcool e da loucura,
afundava-me no peso da minha desgraça engarrafada!...
Numa manhã, na Praia do Farol, depois de louca
noite de embriaguez, acordei na praia, só com a roupa
do corpo, sem documentos, sem dinheiro, mas somente
dominado pela compulsão desesperada de tomar
o primeiro gole! Meu Deus, como era tão premente
aquela ânsia... Eu precisava de novo me embriagar!...
Entrei num boteco, trôpego, mãos trêmulas, semblante
desfigurado pela compulsão, e, com voz hesitante,
falei para o dono do bar: “Amigo, sei que é mole
Esta desculpa, mas um favor me faça:
não tenho dinheiro, mas preciso de um gole!
por favor, pode me dar um copo de cachaça?”
O debochado sujeito, com um sorriso galhofeiro,
respondeu: “Nada feito, cara, aqui só a dinheiro!”
Invadiu-me um desespero imenso, ao receber
a humilhante recusa. Precisava tanto daquele trago!...
Abatido, já ia retirar-me quando ouvi um rapaz dizer:
“Cara, dê uma garrafa para ele. Eu pago”!
Minha vida, que já deu um romance, daria mais?
Pode ser! Mas, quantos escreva, aquele rapaz,
que não me deu emprego, dinheiro ou alimento,
é um personagem que me desperta gratidão de verdade.
Era uma simples garrafa de bebida, mas, naquele momento,
aquela garrafa continha o meu sonho de felicidade!
Anos depois desse fato, do AA recebendo a mensagem,
tampei a minha garrafa e reabri a alma. A minha homenagem,
pois, a esse rapaz, não é pela droga psicoativa que tal
garrafa continha e que para mim hoje nenhum valor tem;
é porque, quando eu pedi a esmola, ele a deu, incondicional,
sem se importar com “o quê” ou “a quem”!